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terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Expressão - por Alba Vieira

O que pinto? E para quê?
Minha pintura, não a faço: se extravasa de mim. Não há intenção, não participa a porção volitiva, só existe a emoção que escorre livremente. É como uma harmonização, uma tentativa de equilíbrio. Quando o que me habita atinge um limiar, é preciso exprimir. Não sei o que pinto, apenas descubro o que se formou na tela a partir de meus movimentos, depois de terminada, olhando-a e, principalmente, sentindo-a. Por vezes está inacabada e horas ou dias depois um novo traço a completa e pode modificá-la completamente.
A minha linguagem é através de imagens e são imagens livres, soltas, ilimitadas, capazes de traduzir uma variedade de sentimentos e serem captadas, entendidas, visualizadas ou mesmo intuídas por qualquer observador.
Nem sempre pode ser compreendida no plano cognitivo por aquele que impressiona. Pode causar espanto, apreensão, medo; pode maravilhar, emocionar, deslumbrar, entristecer, causar náuseas: sensibilizar. Algumas vezes provoca um incômodo, atiça, tenta mobilizar. Instiga sempre. O fato que é que atinge; às vezes de forma indelével, outras vezes demolidora.
O que pinto já nasce pronto, é como uma pictografia. Mas quem se expressa não são sempre outros egos, podem ser subpersonalidades minhas, tantas que nem eu conheço ainda e que necessitam de expressão.
Pintar é para mim terapêutico porque me permite integrar meus eus sem dizer palavra. Na verdade, substitui a palavra. Busco o silêncio.
Depois que termino um quadro, passo por ele e ele me chama para que o olhe profundamente. Muitas vezes preciso de tempo, de várias miradas, de fixá-lo ou de passar através dele e estar em outro lugar, de me expandir caindo nos abismos que retrata ou levitar envolta em cores suaves ou mesmo ser tomada e girada e arremessada longe, depois de ser tragada pelos redemoinhos de cores quentes. O fato é que há um convite para interagir com as imagens e ser transformada por elas. E também visualizo rostos e formas esboçadas.
Acredito que acontece assim com todos que pintam e com todos que são impressionados por uma obra de arte. O que difere é a profundidade da comunicação.
Sei que nesta forma de comunicação subliminar ocorre o mesmo que observamos em relação a pedras e cristais, alguns livros, lugares especiais: não somos nós que os escolhemos, eles nos escolhem. E assim também com animais de estimação, adereços, músicas e, porque não, com amigos e filhos adotivos? A propaganda se utiliza disto e todos nós vivenciamos todo tempo esta forma de interação.
Não é necessário traduzir ao nível cognitivo para ser atingido por uma imagem. Felizmente, a interação entre as pessoas ultrapassa o sentido das palavras, o olhar se aprofunda além do que se vê objetivamente e o corpo se expressa mais do que pretende, com os gestos. Somos seres ilimitados, mesmo quando não conseguimos perceber.
A arte é uma linguagem que expõe o artista, que mostra quem ele é e o que pretende nesta existência ou mesmo que serve de veículo para retratar conteúdos latentes de vivências passadas fazendo pressão na sua consciência. Daí sua função terapêutica.
Um quadro costuma escolher seu dono e não o contrário. É engraçado numa exposição alguém declarar que precisa adquirir aquela obra que sente como se já fosse sua. É que foi atingido em cheio por ela, houve um reconhecimento.
Ainda tenho apego pelos meus quadros e não consigo vendê-los, talvez porque ainda não cumpriram sua função. Não basta terem exonerado meus conteúdos, ainda tenho que captá-los, entender alguns decifrando-os ou apenas intuindo outros. Hoje ainda são meus e ficarão comigo como filhos, só que me preparando e não o contrário, então poderei soltá-los para que encontrem e elejam seus outros donos com quem passarão a interagir e transformar.
É bom pintar, brincar a sério com as cores, sentir nos dedos as texturas das tintas, o relevo da tela, o cheiro da mistura de cores e o assombro pelas imagens que se formam. É assim na vida quando o prazer é mergulhar completamente, se aprofundar nas vivências, misturar-se com os semelhantes e enxergar cada vez mais claro o que está por trás das evidências.
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