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(Aviso: Os textos em amarelo pertencem à categoria
Eróticos.)




terça-feira, 22 de dezembro de 2009

E Por Falar em Natal - por Fatinha

Querido Brógui:

E por falar em Natal, quem aqui nunca recebeu um presente nada a ver?

Começando pelo nefasto amigo oculto, uma solução boa pra economizar uma grana, mas sempre causa de profundas decepções. Há muito tempo que eu não participo de um, mas sempre acontecia a mesma coisa: eu me esmerava em comprar uma coisa maneira e recebia um treco que eu jamais em sã consciência teria coragem de dar de presente nem se fosse para meu inimigo oculto.

As situações mais embaraçosas são aquelas em que a pessoa toda sorridente diz pra você que o presente é a sua cara. Quando ouço isso tremo nas bases, porque lá vem bomba (eu tenho cara de bomba?). Como minha santa mãezinha me domesticou muito bem, eu agradeço, disfarço a decepção e penso: “Que que eu faço com isso?”.

Eu mesma já devo ter dado presentes assim. Munida da mais singela intenção de fazer o outro feliz e acabando por dar um tiro na água.

Já sei. Você deve estar procurando no seu disco rígido quais foram os presentes dados a mim e tentando adivinhar se eu gostei ou não. Pode parar de se torturar porque você nunca vai saber mesmo. E também nem pense em parar de me dar presentes por causa disso, porque aí eu vou ser obrigada a escrever um diário-denúncia dedurando você.

Em retribuição ao carinho, mesmo não gostando da coisa, procuro usá-la, em homenagem à pessoa que me presenteou. Sim, Querido Diário, minha crueldade tem limites. Não é assim que funciona? O outro me faz feliz dando e eu tento fazê-lo feliz usando. Quando não dá mesmo pra salvar o presente – há casos irremediáveis como roupa pequena, ou uma bijouteria que vai deixar minha pele em carne viva – há solução. Vou trocar, passo adiante – nem adianta fazer cara feia porque duvido que você nunca tenha feito isso – ou simplesmente meto no fundo do armário e pronto.

Temos aqui em casa a nossa secretária do lar – nome politicamente correto para empregada doméstica – que todo Natal traz um presentinho para nós. Ficamos sempre comovidos porque sabemos o quanto o dinheirinho dela é curto, inversamente proporcional ao prazer que ela sente em nos presentear. Quando ela vem toda contente com o embrulhinho na mão, entramos em pânico porque a cada ano ela se supera trazendo objetos de decoração pavorosos.

Um ano ganhamos um porta-papel higiênico. Sabe aquele que a gente pendura os rolinhos na parede? Tem coisa mais cafoninha? Na minha escala de valores, está no mesmo nível da roupinha para bujão de gás ou o pano de prato calendário – aqui em casa não usamos gás de bujão, graças a Deus.

No ano seguinte foi um vasinho de flores artificiais cor-de-rosa com areia colorida também cor-de-rosa. De chorar. O problema das flores artificiais é que além de serem horrorosas não morrem nunca. Não secam, não apodrecem. Só ficam ali se enchendo de poeira e desafiando meu senso estético. E tem mais: tudo quebra, menos o tal do vasinho.

Esse ano, veio a pérola. Umas flores amarelas – artificiais também – submersas em um aquário, com os dizeres: “Jesus o segredo da paz”. Tem noção?

PAUSA PRA EU RIR, TÔ ME CONTORCENDO, O TROÇO É MUITO FEIO…

O pior é que não dá pra defenestrar as coisas. Ela vai dar falta e ficar magoada. Solução: deixar os enfeites enfeiando o ambiente e ela sorrindo. Muito justo.

Mas, vou confessar a você que eu e minha santa mãezinha já arquitetamos o plano maligno de deixar esses objetos ao alcance do João Pedro. Se ele quebrou o galo do Presépio que armamos aqui em casa desde que eu me entendo por gente, tenho certeza de que não vai falhar nessa nobre missão que vamos a ele confiar.
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Postado, originalmente, em 26/12/2007.
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O Camping do Fim do Mundo - por Escrevinhadora

Eu tinha perto de 16 anos e quase não saía de casa. Meu pai, um homem antiquado e severo acreditava que lugar de mulher é em casa, que uma moça deve casar-se virgem e me trazia sob rédeas curtas (a década de 60, a pílula, a revolução sexual não tinham entrado na cabeça dele). Meu sonho de consumo era acampar. Algumas amigas de colégio já tinham acampado e vivam contando maravilhas sobre isso. Então eu me mordia de vontade.
Num fim de semana prolongado minha prima, mais velha que eu uns dois anos (ela já era maior de idade) ia acampar com duas amigas, acompanhadas pela mãe de uma delas. Eu não sei que milagre aconteceu, mas meu pai concordou que eu também fosse (acho que foi influência do meu tio, que prometeu que a prima tomaria conta de mim).
Então na sexta-feira, logo após o almoço, não sem antes ouvir um sermão do meu pai me garantindo que me moeria de pancada se por acaso eu bebesse ou fumasse (coisas piores que isso ele nem ousava supor que eu pudesse fazer), lá fui eu, cheia de expectativa e fantasias.
Chegamos ao acampamento no começo da tarde. O camping, na verdade, nada mais era do que um velho sítio que o proprietário resolvera transformar num negócio alternativo. Cobrava uma taxa de quem armasse barracas em seu terreno. Em troca, oferecia banho (água fria, de um pedaço de cano pendente da parede do lado de fora da casa), um único banheiro dentro da casa e um lugar pra lavar louça (dois tanques velhos nos fundos da casa).
Armamos nossa barraca e saímos pra um passeio de reconhecimento. Tinha chovido durante toda a semana e o terreno era um lamaçal só. O rio prometido na propaganda nada mais era do que um fiozinho de água, correndo sobre umas pedras cobertas de limo. O sítio tinha muito mais mato do que plantas. Mas eu, tão excitada com minha aventura, não notei nada de errado.
Até que me deu vontade de fazer xixi...
Para ir ao banheiro, era preciso passar pela sala da casa, que também servia como uma espécie de escritório do proprietário. O sujeito, por si, já era um tipo assustador. Moreno, pele muito queimada de sol, barba e cabelos compridos que ele trazia presos num rabo de cavalo, braços musculosos e cobertos de tatuagens (estrelas, dragões, espadas) e um vozeirão de trombeta.
A sala, escura e recendendo a incenso, era um museu anárquico. Havia caveiras na estante, teias de aranha pelos cantos, numa parede um quadro enorme que deveria ser a representação do inferno (homens e mulheres nus, se retorcendo sobre labaredas), uma coruja empalhada e mais uma infinidade de objetos estranhos e assustadores. (Depois vim a saber que o homem pertencia a uma seita que esperava o apocalipse, o fim do mundo que deveria ocorrer na virada do milênio. Misturava Jesus com John Lennon. Acreditava que no dia do Juízo o demônio despertaria de seu sono nas profundas do inferno e voltaria para um duelo final com Deus. Era vegetariano. Consumia e oferecia aos hóspedes que comungassem de suas crenças, um chá produzido lá mesmo no sítio, que possuía a miraculosa propriedade de purificar o corpo e preparar o espírito para o grande momento da transição.)
Mas voltemos ao desenrolar da história: atravessei a sala com as pernas meio trêmulas. Entrei no banheiro, fechei a porta e já ia me sentando no vaso quando levei um choque: na parede à minha frente, em tamanho natural, uma imagem de Jesus. Tentei abaixar a cabeça, olhar para um lado, para outro, não adiantou. Meu olhar era atraído pelo olhar hipnótico daquela figura. Impossível fazer xixi com Jesus me olhando daquele jeito. Apertadíssima, saí às pressas do banheiro e fui procurar lá fora uma moita que pudesse me servir. Encontrei uma, me abaixei e já estava me aliviando quando vi, bem pertinho de mim, imenso, verde, olhos esbugalhados, um sapo. Saí correndo, escorregando na lama, a calcinha que eu tentava erguer enquanto corria, se enroscando em minhas coxas.
A partir daí meu final de semana dos sonhos se transformou em pesadelo.
Vasculhei o sítio atentamente e descobri que havia sapos em todos os cantos, de todos os tipos, pequenos, grandes, verdes, marrons, cinzentos.
Dormi mal ou mal dormi todas as noites que passei lá. Depois de verificar se a barraca estava hermeticamente fechada eu me enrolava toda no cobertor, sem deixar nenhuma fresta. Mesmo assim, passava horas de olhos abertos no escuro, esperando que a qualquer momento um sapo fosse entrar debaixo das cobertas, subir pelas minhas pernas, pular em cima do meu peito. Xixi eu só fazia nas moitas, depois de examinar cada metro do terreno pra ver se não tinha nenhum sapo por perto. O resto eu nem fazia. Passei o fim de semana com a barriga inchada, cheia de gases, dura feito um tambor.
Minha prima, surpreendentemente, parecia muito relaxada, totalmente integrada ao ambiente (algum tempo depois descobri que era efeito do chá servido aos iniciados; na verdade, cogumelo alucinógeno, nada mais que isso). Não contei pra ninguém, porque não sou dedo-duro e também porque não queria ficar mal com minha prima.
Desde então, mais de 20 anos são passados. O mundo, felizmente, não acabou.
Mas eu nunca mais quis saber de acampar em toda minha vida.
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Certeza - por Alba Vieira

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Coisa mais certa nesta vida... é o descaso.
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.Comentário em Recado, de Ana.
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Entrevista com o Papai Noel - por Cacá

Arcanjo Isabelito Salustiano*, o filósofo das ruas, estava passeando pelos shoppings e feiras da cidade em busca de assunto, já que desde o início do ano ele já sabe para quem pode e quanto pode gastar com presentes. Encontrou vários Papais Noéis, tirou fotos, conversou muito e observou tudo, até o momento em que passou um cara e roubou um saco que estava ao seu lado. Provavelmente pensou que estivesse cheio de presentes ou dinheiro. Tudo caixa vazia. Enquanto as crianças e populares corriam atrás do sujeito, ele conseguiu essa rápida entrevista com o Papai Noel.

ARCANJO: Papai Noel, explique para nós a sua origem geográfica. Não precisa falar de sua onipresença, isso todo mundo sabe. Onde fica essa tal de Lapônia?

PAPAI NOEL: A Lapônia não é um paraíso fiscal como muitos podem pensar. O saco cheio que carrego é proveniente de muitas doações de gente honesta do mundo inteiro. E a Lapônia fica num lugar onde as renas nascem. Nem avião chega lá. Só as renas. E só as minhas. Rena é um bicho criado exclusivamente para Papais Noéis.

ARCANJO: A tradição cristã fala também que você é a representação do São Nicolau?

PAPAI NOEL: Era, meu filho, era! Pelo menos aqui no Brasil! Apareceu aí um certo Nicolau, de quem falam ser ele um juiz e derrubou a minha reputação de bondade, caridade e solidariedade. Já pensou eu ser tratado pelas criancinhas de Lalau? Vamos ficar só com o epíteto do “bom velhinho”, que já tá bom...

ARCANJO: E sendo assim, meio gordo, por que entrar pela chaminé?

PAPAI NOEL: Isso vai se modificando com o tempo, meu filho. Em primeiro lugar, são raríssimas as casas hoje em dia em que há chaminés. Aliás, o número de casas vem só diminuindo. Nos prédios onde não tem elevador, eu ainda tenho é que subir escadas em vez de descer pela chaminé. Eu tenho que tocar nos interfones e há lugares onde é difícil liberarem minha entrada. Tem tanto clone de Papai Noel mal intencionado por aí... Quanto à chaminé, era uma forma de me aquecer, já que de onde venho é muito frio. Agora, além do sumiço das casas, e com esse aquecimento global, já estou querendo é mudar o uniforme, algo mais leve.

ARCANJO: Por que você não se adapta em cada região aos seus costumes? Por exemplo: esse negócio de neve no Brasil nesta época do ano, não cola com a sua imagem nem com o clima. Não acha muito americanizada a sua atitude? Você não estaria puxando a brasa para a sardinha dos americanos? Quer dizer, trazendo essa ideia de neve para cá em pleno verão? Eles já dominam tantas coisas no mundo... Será que o Natal não pode ser cada um com seus costumes e deixar o ecumenismo somente para celebrar o nascimento de Cristo? Não bastou esse tal de panetone que você espalhou por aqui? Deu até confusão numa certa cidade lá no planalto central do Brasil. Tinha um cara disfarçado de Papai Noel sem o devido traje roubando dinheiro e dizendo que era para distribuir panetones aos pobres...

PAPAI NOEL: Bom, em assuntos internos de cada país eu não me meto, sabe como é, a minha imagem universal... Imagine se eu chego no Brasil, por exemplo, e me visto de bermuda, chinelão, boné e camiseta regata? Aonde iria parar a minha credibilidade com as crianças? Fora o fato de que eu iria ter que ficar me explicando para a polícia. No mínimo iam me confundir com vagabundo. Ou então, num traje desses com um saco nas costas, eu ia era ganhar esmolas.

ARCANJO: Obrigado seu Noel. Quer deixar uma mensagem final para seus fãs no mundo inteiro?

PAPAI NOEL: Se quero! Tenho notado que em todo lugar as pessoas, por mais que dêem e ganhem presentes, estão sentindo falta de mais presença do outro em suas vidas. Disfarçam as suas faltas e carências com artigos de consumo imediato mas não conseguem preencher seus espíritos com uma substância que não está à venda em nenhum lugar. Eu gostaria mais de ser outros símbolos. Queria simbolizar mais a tolerância em vez da indiferença. Mais a humanização em vez da coisificação. Mais a essência em vez da aparência. Queria que fôssemos mais sujeitos das coisas e valores e não meros objetos de dominação por falta de envolvimento real nos destinos de cada lugar, de cada país.
Eu desejo natais onde, em vez de meu sem graça HÔ,HÔ,HÔ, eu poderei escancarar um satisfeito HAHAHA!
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*ARCANJO ISABELITO SALUSTIANO é um personagem que criei.
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O Meu Melhor Presente de Natal - por Esther Rogessi

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Naquele 23 de dezembro, acordei durante a madrugada e, na minha cabecinha de criança, contando apenas 7 anos de idade, fiquei sonhando acordado com o Natal. Eu não sabia bem o que era, porém ouvi os meus colegas do ‘Grupo Escolar’ contarem uns para os outros os pedidos feitos ao ‘Papai Noel’... E, timidamente perguntei-lhes:
– Quem é? Vocês têm um pai com o mesmo nome?
– Não! Seu bobo... Papai Noel é um velhinho que no dia de Natal dá presentes às crianças... Você nunca ganhou presentes dele não?
– Não... eu não tenho pai...
Imediatamente Hugo respondeu:
– Não é preciso ter pai pra ganhar presente do papai Noel!...
Perguntei-lhe:
– Não?...
– É claro que não! Eu não tenho pai, mas todo Natal Papai Noel me dá presente! - falou o Marquinhos, outro colega nosso, todo orgulhoso...
E perguntei espantado:
– Ah... Ele dá mesmo? Como é que eu faço? Como é que ele vai saber onde moro?
Hugo disse alegremente:
– Minha mãe me ajuda a fazer o pedido, me diz o que é melhor. Sabe? No Natal passado, eu pedi uma bicicleta, então a minha mãe disse que o Papai Noel era muito velhinho e que era difícil para ele subir o morro, carregando tantos presentes e, ainda mais, uma bicicleta pesada... Eu concordei com ela e pedi um carro bem bonito...
– E ele deu?
– Claro! Igualzinho ao que eu mostrei a minha mãe!
– Ah... Foi mesmo?

Fiquei pensando durante todo o dia... Como eu queria ganhar um presente... Quando mamãe chegou do trabalho – minha mãe trabalhava há dez anos na casa de um casal de médicos –, contei para ela sobre a minha conversa com os meus colegas. Ela ficou em silêncio, olhando para mim... E vi lágrimas escorrendo por suas faces... Perguntei-lhe:
– Por que a senhora está chorando, mãe?
– Por nada filho... É que eu cresci sem natais e esqueci de fazer você viver os seus... Perdoe-me, filho... Mas, o que você gostaria de ganhar mesmo?
– Um carro bem bonito!
– Vou falar para o Papai Noel, está bem?

Ah! Que alegria eu senti... Pela primeira vez, eu ganharia um presente do Papai Noel...
Papai!” Que palavra mágica! Boa de falar... Ah! Eu cresci chamando mamãe e só mamãe. Não sei do meu pai... Algumas vezes eu perguntava a minha mãe: – Mãe, por que eu não tenho pai? Por que eu não sou como as outras crianças?
Ela rodeava, porém não me falava a verdade.

Foi perdido em sonhos, com a alma agitada, que naquela madrugada abafada, no escuro do meu barraco, fitando o teto de zinco, me refrescando através dos chuviscos de uma chuvarada repentina que se fez cair... no descanso do desconfortável sofá sem pés rente ao chão, com um único lençol que eu tinha de optar entre forrar o seu plástico barato para não me esquentar as costas durante o sono ou me cobrir, me livrando dos pernilongos que brigavam entre si em disputa pelo meu sangue. Já passava das vinte e quatro horas. Havia uma casa de jogos próximo ao nosso barraco, que costumava fechar muito tarde, eu ouvia os comentários da vizinhança, que o seu fechamento se dava após as vinte e quatro horas... Ouvindo o barulho do fechar de portas, deduzi ser muito tarde... A minha mãe ainda não tinha chegado, porém eu não sentia medo, os meus pensamentos eram tão bons... Quantos sonhos!
Pelos furos do zinco, percebi pequenos raios luzentes, entrando e causando um efeito bonito no nosso barraco de dois cômodos. Os pingos fortes da chuva faziam-se ouvir no zinco... Era como se Deus estivesse a me falar em mensagem codificada: ‘Estou bem presente aqui, não estás só! Trago o céu para ti como presente de Natal, essas são as luzes de todos os natais que você não viveu meu filho!’...

Comecei a chorar mansinho. Eu era criança, não entendia... Mas, no meu coração, eu ouvia uma voz doce que, de repente, deixou de falar dentro do meu coração e inundou o nosso barraco, uma doce voz que soava forte; que se fazia ouvir como que fosse amplificada, enquanto o lugar simples e humilde ficava repleto de estrelas... O chão de barro batido, os poucos utensílios e projetos de móveis, a ‘minha cama’, tudo estava bordado por estrelas de luz tênue... Sou o teu Deus! O Pai dos órfãos e o marido das viúvas... Sou eu que zelo por ti e vou te dar o presente de Natal que, Noel não poderá te dar , não o receberás aqui, no morro, mas te farei descer o morro para recebê-lo, porque SOU o teu Deus!

Não sei se aquela voz se alongou ao falar-me... Foi um bálsamo para a minh’alma inocente e ansiosa, perdida em questionamentos mudos. A doce voz inundou não só os cômodos do nosso barraco, porém a minha alma... Adormeci ouvindo-a... não vi a minha mãe chegar. Acordei com ela me chamando, me apressando, pois iríamos passar o Natal na casa dos patrões da minha mãe – o casal de médicos –, algumas das vezes ela me levava para passar o dia lá... juntinho a ela naquele apartamento imenso e elegante.

O Dr. Fábio ficava olhando-me demoradamente... Algumas vezes era carinhoso... Eles não tinham filhos, a Drª Olívia – sua esposa– era estéril. Eles estavam em férias. E planejavam viajar logo após o Natal. A minha mãe também teria férias... Poderíamos ficar juntos por mais tempo. A família dos patrões da mamãe morava em outro país... distante, muito distante! Naquela noite de véspera de Natal éramos em número de quatro. Jantamos alegres e, em seguida, a Drª Olívia nos convidou para nos assentarmos junto à grande árvore de Natal, muito bonita e iluminada, com várias caixas de presentes embaixo... À vista de todos, o Dr Fábio calmamente me perguntou:
– O que você pediu ao Papai Noel, filho?
Olhei para ele muito sério e lhe respondi:
– Eu e minha mãe pedimos um carro bem bonito... Mas eu ouvi uma voz muito bonita e calma no meu coração dizendo que Ele era o pai dos órfãos e marido das viúvas e que eu não estava só... e que iria me dar um presente que o Papai Noel não poderia me dar, e eu teria que descer o morro para recebê-lo... Eu já não sei mais o que vou ganhar... Sabe o que eu queria mais do que qualquer presente doutor?
– Não, filho! Não sei... O quê?
O meu pai! O meu pai de verdade! Eu só tenho mãe...
Sem entender, vi o Dr. Fábio chorar como eu nunca pensei que um homem pudesse fazê-lo... Mesmo eu sendo tão pequenino, entendi que algo muito sério estava acontecendo naquela noite de Natal... E espantado vi o Dr. Pegar as mãos de sua esposa e lhe pedir perdão em pranto, a minha mãe nervosa colocou as mãos na boca e gritou:
Não! Não conte, Fábio!...
Fiquei mais confuso ainda... A minha mãe chamara o doutor simplesmente de Fábio... Ele não a ouviu e contou a doutora Olívia – a sua esposa – que eu era seu filho...
Não ficamos para a entrega dos presentes... mamãe me pegou e saímos rapidamente...

A minha vida mudou, a nossa vida mudou! Minha mãe não mais precisou trabalhar em casa de família, eu ganhei o pai que eu pensei não ter, o doutor Fábio me reconheceu como filho, nos deu uma casa decente, uma pensão para minha mãe cuidar de mim... E sua esposa, ao longo dos anos, lhe perdoou. Não se separaram. Não fiz a infelicidade deles, causei lágrimas, é verdade... Sem querer fiz a boa doutora sofrer...
Entendi que eu não deveria desejar presente algum na vida... Além do que ‘Aquela doce voz’ me deu... Ele cumpriu com suas palavras! A verdade sempre vence! Pois ela é amor, é fruto do Espírito de Deus e o amor vence o mundo!
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