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domingo, 12 de julho de 2009

A Revolta do Pão de Queijo - por Bruno D’Almeida

O casal mineiro, em plena primeira viagem de namoro, foi barrado na saída do hotel em Gramado com dois pães de queijo na mão. Eles não podiam ficar para a belíssima ceia matinal, pois estavam atrasados para um passeio pelas cidades das serras gaúchas. Diante de compotas de doces de leite, de goiaba, guloseimas de chocolate, suco de uva Isabel, bolos e tortas caseiras, frutas macias, frescas e doces, cestas de todos os pães possíveis e imaginários, eles não podiam levar um pão de queijo.

Depois de uma argumentação amigável, uma discussão controlada e vários xingamentos inomináveis, deu-se naquele lugar a maior revolução desde que os farrapos se voltaram contra o poder do Império. A bela mocinha disse que aquele trem não ia ficar barato, e quando voltassem do passeio de trem em Bento Gonçalves, o dono do hotel ia ver com quantos pães de queijos se faz uma Maria Fumaça. O gerente devolveu um bá, guria, deu pra ti, e eles saíram revoltados sem ao menos saber o que aquela expressão regional significava.

Entraram indignados na van que os conduziria ao passeio. Nem todo o glamour das ruas perfeitas de Gramado e seu Festival de Cinema com estrelas do Brasil e do mundo, nem a arquitetura colonial alemã imponente de Canela, nem o frescor do vento matinal de Nova Petrópolis, nada os animava. As belíssimas peças de inox na maravilhosa fábrica de artefatos domésticos de Carlos Ribeiro eram uma monotonia. As provas de queijos e vinhos se tornaram entediantes. O passeio no Maria Fumaça não teve a menor graça. Era um paradoxo: enquanto todos ao redor estavam felizes e admirados com tudo, um casal recolhido a uma tristeza inquebrantável formava uma imagem fosca daquele belo quadro.

Bastou um ato de desrespeito e de descortesia para mudar a percepção de todas as coisas. A maior revolução que podemos nos permitir é a mudança do olhar. Um mundo de magia pode se transformar no pior dos porões das almas castigadas de qualquer inferno imaginário. Findado o passeio, o casal pôs em prática o plano que arquitetaram durante todo o dia.

Foram a Câmara Municipal, à rádio e ao jornal. Cada pessoa que encontravam no saguão do hotel era informada da barbaridade que tinham passado. Almoçando, passeando, a todo o momento contavam o acontecido. Passaram a acordar mais cedo para participarem do café da manhã do início ao fim para relatar a quem quer que fosse o direito augusto de um mineiro comer seu pão de queijo.

A confusão chegou aos ouvidos do prefeito da cidade. De maneira diplomática e evidentemente política, foi se retratar publicamente ao casal na frente do hotel e na presença da comunidade local gramadense. Disse que a razão de existir do povo gaúcho daquela região era tratar bem cada turista. Que eles tinham razão na sua revolta e que um acontecimento isolado não podia macular toda a grandeza de um povo. Ao lado do dono do hotel, que perdera quase metade dos hóspedes em dois dias de confusão, pediram perdão pelo ocorrido, dando ao casal passagem e hospedagem uma vez por verão pelo período de dez anos.

Voltaram para casa de alma lavada, travestidos do espírito de luta dos mártires da Inconfidência Mineira. Tomando um chimarrão no fim da tarde, souvenir comprado na viagem, os nossos ferrenhos defensores dos direitos do consumidor estampavam um sorriso no rosto maior do que qualquer trem bão que você possa imaginar.



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Um comentário:

Ana disse...

Muito boa esta, Bruno!
Adorei!
Ri baldes!