Foi uma quarta-feira muito nublada, tinha certeza que iria te ver. Quando entrei no trem, lembranças brotaram em minha mente, lembranças de uma amizade superficialmente verdadeira, de meninas inocentes. Sim, eu sei que você preferiria o termo “pirralhas”, mas não vamos confundir as coisas. Naquela época meus segredos eram explícitos, meus medos escancarados e minhas vontades eram patéticas, mas incrivelmente achamos alguém que nos compreender e nos dar o que mais precisamos: um ouvinte. Sim, precisamos de um ouvinte para sorrir, chorar, gritar, confessar e consolar. Você já foi minha ouvinte, talvez depois desses estúpidos longos dois anos nossa amizade não seja a mesma, mas a ouvinte continua dentro de mim, ocultada pelo tempo e assustada pela distância.
Percorri o caminho até sua casa fitando cada detalhe, como se nunca tivesse estado ali, mas, para meu desespero, cada centímetro daquela calçada trazia uma lembrança sua. E você apareceu, pude te observar pela porta, não tinha mudado muito, você sempre foi a mesma amiga de sempre, só que, é claro, sua aparência agora transbordava no que você sempre foi por dentro.
Pela primeira vez abracei alguém como se tivesse escapado da morte, te olhei nos olhos com saudade e você retribuiu meu olhar, pude ter certeza de que você era a mesma pirralha de dois anos atrás. Conversamos durante horas, como se aqueles dois anos fossem uma página arrancada de um livro, como se eles tivessem simplesmente se perdido em meio a recordações.
Andamos pela cidade como se nunca tivéssemos feito aquilo, falamos e recordamos coisas que somente me fizeram sentir mais feliz por te ver novamente.
Fui embora em meio à chuva, recebi seu abraço, apertado, como se dissesse: “obrigada por estar aqui” ou “não esqueça mais de mim assim”. Não foi preciso mais que um abraço e uma palavra para perceber que uma amizade pode, sim, resistir a certas distâncias.
No caminho de volta sofri uma ressaca de recordações que, em sua maioria, me fizeram lembrar quem sou hoje; outras só serviram para me fazer sorrir nessa noite de chuva.
Percebi que certas amizades realmente podem ser eternas. Infelizmente uma fatalidade ocorreu e só naquele momento pude ver como fui egoísta em não ter te ligado ou te visitado quando tive tempo. Percebi que, apesar de tudo, você pode ser minha ouvinte. Obrigada por ser tão especial assim, obrigada por ter gritado comigo, cometido loucuras, manchado as lembranças, ver o invisível, escutar o silêncio, fazer o impossível, me fazer sorrir, sentir saudade, obrigada por ser a pessoa com quem posso contar a qualquer momento, obrigada por ser a melhor amiga.
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Someday I’ll Love Ocean Vuong / Um dia amarei Ocean Vuong [Ocean Vuong]
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*Beautiful photomechanical prints of Lotus Flowers (1887–1897) by Ogawa
Kazumasa.*
Ocean, não tenha medo.
O fim da estrada é tão distante
que ela já ...
Um comentário:
Duanny:
Seu texto está muito legal!
E a foto é linda! AMEI!
Beijo pelo Dia do Amigo!
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