Conversando com uma amiga pelo telefone percebi sua voz diferente. E esta percepção permaneceu nos dias subsequentes. Mas eu não conseguia precisar qual era a diferença. Resolvi perguntar-lhe. Ela ficou surpresa. Não havia notado em si, a princípio, nenhuma diferença. Também as outras pessoas nada lhe haviam dito. Mas eu insisti por várias vezes e ela acabou notando que realmente estava diferente. Tentamos esclarecer qual teria sido a mudança. Mas era difícil captar, expressar com palavras. Finalmente entendi que ela estava mais segura, sua voz mostrava que se sentia mais plena. Ela concordou e buscou saber o que teria proporcionado isto. Avaliamos desde quando estava assim. Quando chegamos ao momento em que ocorrera a mudança, ela logo a associou a um acontecimento: foi depois que chegou a sua cama. Havia comprado, há alguns dias, uma cama nova. E eu quis então saber qual a relação. Por que uma cama nove trazia aquela nova forma de estar no mundo?
Aí começa uma história que me tocou profundamente e tento agora dividir com aqueles que tiverem sensibilidade para percebê-la na sua totalidade.
Minha amiga foi criada, até por volta dos 5 anos, pelos avós. Neste tempo foi respeitada, cuidada, percebida como pessoa em toda a sua expressão. Foram tempos bons de receber carinho, de moldar toda a existência que teria pela frente. Mas um dia seus pais a levaram de volta. Separou-se dos avós, indo para onde não queria. E para minorar a saudade de tudo, o avô presenteou-lhe com uma cama, para que quando fosse dormir pudesse lembrar-se deles, dos momentos vividos antes. E a cama tinha a guarda cor-de-rosa, com losangos de contornos brancos, em sintonia com o que a cama lhe trazia: o preenchimento do sentimento, o afago no coração, na sua sensibilidade. Assim desfrutou, por muito tempo, desta proximidade com os avós, como um tempo de amor, de cuidado, de alegria.
Um dia, voltando da escola, encontrou os pais, enlouquecidos que eram, na sala, costurando capas de napa de cor marrom ou verde-escuro em espumas, fazendo colchonetes que não compreendeu de imediato para que serviriam.
Então indagou-lhes o que era aquilo e como resposta ouviu que agora os filhos dormiriam nestes colchonetes, sem travesseiros, porque era muito saudável para a coluna vertebral. Espantada, queria saber de onde haviam tirado aquela ideia. Responderam que era assim na Índia. Estava decidido. E as camas, o que seria feito delas? As camas? Já estava tudo resolvido. Correu para o quarto, que encontrou vazio. No quintal, uma fogueira quase no fim, onde ardiam os restos de sua cama rosa. Desesperou-se. Correu até os pais e gritou sobre o porquê daquilo. Chorava, vendo em chamas os seus sonhos acalentadores, a sua proteção, o cuidado dos avós, a segurança da sua alma. De nada adiantava aquilo. Não entendiam. Eram loucos. Sofrimento. Desamparo. Endurecimento. Sensibilidade exposta. Carne viva.
O tempo passou. Ela e os irmãos passaram a dormir nos colchonetes que logo ficaram mais finos, trazendo o frio do corpo no contato com a umidade do solo e o frio da alma, sozinha. Os pais continuaram desfrutando de sua cama com os travesseiros macios.
Nunca mais teve uma cama só sua. Por várias razões isto não tinha acontecido. Sempre morara com outras pessoas e tinha sido necessário dividir a cama ou sempre trabalhara muito e, exausta, às vezes dormia em algum sofá. Nunca mais a cama rosa sonhada.
E agora, sem que tivesse a princípio percebido o significado do seu ato, havia encomendado uma cama. Era algo sem muita importância. Precisava montar seu quarto, buscou uma cama. Difícil achar uma que a agradasse. Não era rosa. Então encontrou uma em tons de marfim.
Um dia a cama chegou e, sem que se desse conta, reencontrou, ao nível da alma, o cuidado dos avós, o carinho, a proteção, os dias felizes da infância. Era agora outra, a voz denunciava. Era outra vez ela mesma, por isso mais segura se anunciava.
Eu me emocionei com esta vivência. Outros também se sentiriam tocados. Todos nós, certamente, temos, em algum lugar das nossas vidas, a nossa cama rosa, nosso lugar sagrado, o refúgio da alma.
Aí começa uma história que me tocou profundamente e tento agora dividir com aqueles que tiverem sensibilidade para percebê-la na sua totalidade.
Minha amiga foi criada, até por volta dos 5 anos, pelos avós. Neste tempo foi respeitada, cuidada, percebida como pessoa em toda a sua expressão. Foram tempos bons de receber carinho, de moldar toda a existência que teria pela frente. Mas um dia seus pais a levaram de volta. Separou-se dos avós, indo para onde não queria. E para minorar a saudade de tudo, o avô presenteou-lhe com uma cama, para que quando fosse dormir pudesse lembrar-se deles, dos momentos vividos antes. E a cama tinha a guarda cor-de-rosa, com losangos de contornos brancos, em sintonia com o que a cama lhe trazia: o preenchimento do sentimento, o afago no coração, na sua sensibilidade. Assim desfrutou, por muito tempo, desta proximidade com os avós, como um tempo de amor, de cuidado, de alegria.
Um dia, voltando da escola, encontrou os pais, enlouquecidos que eram, na sala, costurando capas de napa de cor marrom ou verde-escuro em espumas, fazendo colchonetes que não compreendeu de imediato para que serviriam.
Então indagou-lhes o que era aquilo e como resposta ouviu que agora os filhos dormiriam nestes colchonetes, sem travesseiros, porque era muito saudável para a coluna vertebral. Espantada, queria saber de onde haviam tirado aquela ideia. Responderam que era assim na Índia. Estava decidido. E as camas, o que seria feito delas? As camas? Já estava tudo resolvido. Correu para o quarto, que encontrou vazio. No quintal, uma fogueira quase no fim, onde ardiam os restos de sua cama rosa. Desesperou-se. Correu até os pais e gritou sobre o porquê daquilo. Chorava, vendo em chamas os seus sonhos acalentadores, a sua proteção, o cuidado dos avós, a segurança da sua alma. De nada adiantava aquilo. Não entendiam. Eram loucos. Sofrimento. Desamparo. Endurecimento. Sensibilidade exposta. Carne viva.
O tempo passou. Ela e os irmãos passaram a dormir nos colchonetes que logo ficaram mais finos, trazendo o frio do corpo no contato com a umidade do solo e o frio da alma, sozinha. Os pais continuaram desfrutando de sua cama com os travesseiros macios.
Nunca mais teve uma cama só sua. Por várias razões isto não tinha acontecido. Sempre morara com outras pessoas e tinha sido necessário dividir a cama ou sempre trabalhara muito e, exausta, às vezes dormia em algum sofá. Nunca mais a cama rosa sonhada.
E agora, sem que tivesse a princípio percebido o significado do seu ato, havia encomendado uma cama. Era algo sem muita importância. Precisava montar seu quarto, buscou uma cama. Difícil achar uma que a agradasse. Não era rosa. Então encontrou uma em tons de marfim.
Um dia a cama chegou e, sem que se desse conta, reencontrou, ao nível da alma, o cuidado dos avós, o carinho, a proteção, os dias felizes da infância. Era agora outra, a voz denunciava. Era outra vez ela mesma, por isso mais segura se anunciava.
Eu me emocionei com esta vivência. Outros também se sentiriam tocados. Todos nós, certamente, temos, em algum lugar das nossas vidas, a nossa cama rosa, nosso lugar sagrado, o refúgio da alma.
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Visitem Alba Vieira
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Um comentário:
Muito bonito, Alba!
Beijo.
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