A umidade relativa do ar está alta. Isto se reflete no humor das pessoas, há uma leve turvação da consciência. Geralmente, nestas ocasiões, o trânsito fica caótico. Quem observa, reconhece uma certa loucura pairando no ar e os motoristas têm uma direção mais perigosa. Durante a madrugada, a chuva caiu pesada. O dia amanhece trazendo os problemas comuns da cidade: falta de energia elétrica, ruas alagadas, escuridão completa aumentando o perigo de assaltos para quem sai pra trabalhar muito cedo. Nos pontos de ônibus, as pessoas esperam agoniadas sabendo que vão se atrasar para o trabalho e serem descontadas nos seus já magros salários. Os ônibus passam lotados e raramente param nos pontos, pois a pressa é maior, já que sabem que vão ter que enfrentar mais problemas no trânsito causados pela chuva. O estresse neste início de dia é maior para todos.
E acontece o já esperado. Em Benfica, logo cedo, há um grave acidente envolvendo três coletivos. Um deles atravessou o sinal vermelho. A confusão é geral. Há mais de trinta feridos, alguns com gravidade.
Quando passo pelo local posso ver o estrago nos ônibus com as partes dianteiras muito danificadas e intuo que, como provavelmente vinham muito cheios, isto justifica o grande número de pessoas feridas. Quatro ambulâncias estão paradas e, no gramado de uma praça, alguns feridos estão deitados, tendo o atendimento de primeiros socorros. O trânsito fica ainda mais caótico. Os carros estão retornando e isso embola ainda mais o que já é normalmente congestionado.
Penso que aquelas pessoas saíram de suas casas para o trabalho e hoje a sorte não esteve do lado delas, não as salvou da direção perigosa dos motoristas, das más condições de manutenção dos veículos e das pistas, da pressão das empresas aumentando o estresse dos seus condutores. Os anjos da guarda não deram conta. Pudera! Nem eles estão aguentando o aumento de trabalho e exigências.
Chego ao trabalho e começa o barulho de dois helicópteros sobrevoando o morro da Mangueira onde a polícia está fazendo mais uma das suas ações perigosas para os moradores, na busca de bandidos que, há poucos dias, mataram um policial que tentou impedir um assalto. Também há helicópteros de reportagem que tentam documentar e transmitir em primeira mão o acidente, mais um fato triste que faz parte da rotina desta cidade que funciona, na maioria dos setores, no limite da irresponsabilidade.
O que será dessas pessoas? Alguém as ajudará ou as compensará por terem sido sacrificadas nas suas vidas, para que os verdadeiros responsáveis por tudo isso ganhassem um pouco mais à custa do desespero dos seus funcionários? Pensando bem, talvez a sorte não as tenha abandonado de todo. Nesse turbilhão de tantas dificuldades cotidianas, muitos estão estagnados, entristecidos, deprimidos e um acidente assim é, ao menos, um acontecimento, tira as pessoas da situação de “morte” em que estão. De repente, tudo pode mudar, mesmo que seja para pior.
Logo, as notícias estão em todos os telejornais e nas rádios. Todos já estão habituados a esse burburinho e comentar sobre a desgraça alheia acaba dando um “colorido” aos dias iguais.
Mas há ainda outro sinal da “loucura” urbana bem perto dali. No viaduto Ana Néri, os bombeiros trabalham tentando convencer um suicida a desistir da solução que buscava naquele momento, para sua vida de desventuras. Mas consta que está difícil.
Assim está esta cidade. Dizem que acontece em todo lugar. Vejam como, ultimamente, andam caindo aviões por toda parte, sem explicações convincentes e aceitáveis. É tudo muito estranho! Entretanto, como em muitos fatos tristes e lamentáveis que vêm acontecendo aqui no Rio de Janeiro, os fatores incompetência, irresponsabilidade, negligência e impunidade ficam gritantes, como no ocorrido com o avião em que foi detectado um FURO de 30cm na fuselagem quando já tinha decolado e teve que fazer um pouso de emergência, felizmente bem sucedido.
Aqui, quando saímos de casa, estamos expostos a tantas coisas absurdas, que voltar para casa ileso no fim do dia passou a ser motivo de comemoração e de dar graças aos céus.
Assim, esbarrar em moradores de rua dormindo enrolados em plásticos escuros e quase cair, sofrer assalto desses mesmos esquecidos pela sociedade, cruzar com viciados em crack e ser vítima de suas atitudes imprevisíveis, sofrer um atropelamento na calçada, estar envolvido num acidente de trânsito no transporte que utilizar, ser agredido na estação por seguranças da ferrovia às vistas de policial pago pelo Estado para sua defesa ao tentar entrar num trem, ficar pendurado na porta de um ônibus ao subir ou cair no asfalto ao descer quando o motorista dá partida no veículo ou ser arrastado e morrer sob a roda do ônibus sem ser visto pelo motorista, ser atingido por bala perdida (ou não) em algum assalto da hora ou dentro de comunidade invadida pela polícia à procura de algum bandido, ter um traumatismo craniano ao ser atingido por algo que despenca de algum prédio como um vasinho de flores, uma ferramenta usada por algum trabalhador numa construção onde não se usa tela protetora, algum suicida que resolveu abreviar esse desespero em que se transformou viver ou mesmo pedaços de alguma marquise em mau estado de conservação são alguns dos exemplos de ocorrências frequentes. Há outras possibilidades como ser atingido em fogo cruzado nas ruas entre bandidos e policiais ou perto de comunidades, entre facções criminosas, ter um filho arrastado por bandidos que roubaram seu carro ou ter seu carro metralhado por policiais ao ser confundido com o de bandidos (depois de perceberem o engano poderão desaparecer com o seu corpo).
E se conseguir escapar de tudo isso no fim do dia, ainda terá que conviver com as contas a pagar, o mau humor e estresse dos que ficam em casa, as condições de sobrevivência piores a cada dia e os serviços mais deficientes onde mora e, caso seja idoso ou criança, ainda por cima sofrer os possíveis maus tratos evidentes ou velados da família ou cuidadores.
Refletindo sobre todas essas coisas eu me pergunto: o suicida não seria o mais coerente?
E duvido ainda mais uma vez que eu esteja vivendo na CIDADE MARAVILHOSA!
E acontece o já esperado. Em Benfica, logo cedo, há um grave acidente envolvendo três coletivos. Um deles atravessou o sinal vermelho. A confusão é geral. Há mais de trinta feridos, alguns com gravidade.
Quando passo pelo local posso ver o estrago nos ônibus com as partes dianteiras muito danificadas e intuo que, como provavelmente vinham muito cheios, isto justifica o grande número de pessoas feridas. Quatro ambulâncias estão paradas e, no gramado de uma praça, alguns feridos estão deitados, tendo o atendimento de primeiros socorros. O trânsito fica ainda mais caótico. Os carros estão retornando e isso embola ainda mais o que já é normalmente congestionado.
Penso que aquelas pessoas saíram de suas casas para o trabalho e hoje a sorte não esteve do lado delas, não as salvou da direção perigosa dos motoristas, das más condições de manutenção dos veículos e das pistas, da pressão das empresas aumentando o estresse dos seus condutores. Os anjos da guarda não deram conta. Pudera! Nem eles estão aguentando o aumento de trabalho e exigências.
Chego ao trabalho e começa o barulho de dois helicópteros sobrevoando o morro da Mangueira onde a polícia está fazendo mais uma das suas ações perigosas para os moradores, na busca de bandidos que, há poucos dias, mataram um policial que tentou impedir um assalto. Também há helicópteros de reportagem que tentam documentar e transmitir em primeira mão o acidente, mais um fato triste que faz parte da rotina desta cidade que funciona, na maioria dos setores, no limite da irresponsabilidade.
O que será dessas pessoas? Alguém as ajudará ou as compensará por terem sido sacrificadas nas suas vidas, para que os verdadeiros responsáveis por tudo isso ganhassem um pouco mais à custa do desespero dos seus funcionários? Pensando bem, talvez a sorte não as tenha abandonado de todo. Nesse turbilhão de tantas dificuldades cotidianas, muitos estão estagnados, entristecidos, deprimidos e um acidente assim é, ao menos, um acontecimento, tira as pessoas da situação de “morte” em que estão. De repente, tudo pode mudar, mesmo que seja para pior.
Logo, as notícias estão em todos os telejornais e nas rádios. Todos já estão habituados a esse burburinho e comentar sobre a desgraça alheia acaba dando um “colorido” aos dias iguais.
Mas há ainda outro sinal da “loucura” urbana bem perto dali. No viaduto Ana Néri, os bombeiros trabalham tentando convencer um suicida a desistir da solução que buscava naquele momento, para sua vida de desventuras. Mas consta que está difícil.
Assim está esta cidade. Dizem que acontece em todo lugar. Vejam como, ultimamente, andam caindo aviões por toda parte, sem explicações convincentes e aceitáveis. É tudo muito estranho! Entretanto, como em muitos fatos tristes e lamentáveis que vêm acontecendo aqui no Rio de Janeiro, os fatores incompetência, irresponsabilidade, negligência e impunidade ficam gritantes, como no ocorrido com o avião em que foi detectado um FURO de 30cm na fuselagem quando já tinha decolado e teve que fazer um pouso de emergência, felizmente bem sucedido.
Aqui, quando saímos de casa, estamos expostos a tantas coisas absurdas, que voltar para casa ileso no fim do dia passou a ser motivo de comemoração e de dar graças aos céus.
Assim, esbarrar em moradores de rua dormindo enrolados em plásticos escuros e quase cair, sofrer assalto desses mesmos esquecidos pela sociedade, cruzar com viciados em crack e ser vítima de suas atitudes imprevisíveis, sofrer um atropelamento na calçada, estar envolvido num acidente de trânsito no transporte que utilizar, ser agredido na estação por seguranças da ferrovia às vistas de policial pago pelo Estado para sua defesa ao tentar entrar num trem, ficar pendurado na porta de um ônibus ao subir ou cair no asfalto ao descer quando o motorista dá partida no veículo ou ser arrastado e morrer sob a roda do ônibus sem ser visto pelo motorista, ser atingido por bala perdida (ou não) em algum assalto da hora ou dentro de comunidade invadida pela polícia à procura de algum bandido, ter um traumatismo craniano ao ser atingido por algo que despenca de algum prédio como um vasinho de flores, uma ferramenta usada por algum trabalhador numa construção onde não se usa tela protetora, algum suicida que resolveu abreviar esse desespero em que se transformou viver ou mesmo pedaços de alguma marquise em mau estado de conservação são alguns dos exemplos de ocorrências frequentes. Há outras possibilidades como ser atingido em fogo cruzado nas ruas entre bandidos e policiais ou perto de comunidades, entre facções criminosas, ter um filho arrastado por bandidos que roubaram seu carro ou ter seu carro metralhado por policiais ao ser confundido com o de bandidos (depois de perceberem o engano poderão desaparecer com o seu corpo).
E se conseguir escapar de tudo isso no fim do dia, ainda terá que conviver com as contas a pagar, o mau humor e estresse dos que ficam em casa, as condições de sobrevivência piores a cada dia e os serviços mais deficientes onde mora e, caso seja idoso ou criança, ainda por cima sofrer os possíveis maus tratos evidentes ou velados da família ou cuidadores.
Refletindo sobre todas essas coisas eu me pergunto: o suicida não seria o mais coerente?
E duvido ainda mais uma vez que eu esteja vivendo na CIDADE MARAVILHOSA!
Visitem Alba Vieira
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Um comentário:
Sem dúvida alguma: o suicida é o mais coerente! Tô com ele e não abro! Abaixo a insanidade dos bombeiros! Mas, pensando bem, eles estavam apenas cumprindo seu dever... então estão perdoados.
Beijos!
:D
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