De repente aquele menino magrinho se encontrou perdido no meio da praia. Alexsander olhava para tudo e não via nada. Nada além de vendedores de óculos escuros, de água de coco, de picolés e de bronzeadores que besuntavam corpos morenos na areia. Ele via o mar de gente na água, os adultos brincando de frescobol, ele via o mundo passar pela janelas dos seus olhos e não se reconhecia em nenhum rosto, nenhuma paisagem mirava seus pais e sua piscina de plástico azul com peixinhos multicores.
Olhou para o pedaço de cachorro-quente na mão e pensou Papai do Céu, agora só tenho isso para comer pelo resto da minha vida. Fez uma trouxinha com o papel laminado ao redor do seu lanche e o segurou firme como seu talismã da sorte. Apertava com cuidado seu alimento para a alma, a única coisa que lembrava seus pais e a possibilidade de se sentir com eles, de não parecer estar tão sozinho. Minha mãe está aqui comigo, pensava. Nenhuma presença se faz mais concreta do que a lembrança exata de quem mora dentro da gente.
Depois de meia hora sentado e de sentir o ardor do sol na sua pele amarela e fina de pêssego, um casal de idosos vê aquele infante olhando sozinho para o infinito. A pergunta sobre os pais de Xandinho foi seguida de braços abertos e de uma cara de não sei. Partem todos em busca do tão esperado encontro que só precisava acontecer. O garoto começa andar, andar, andar, cansar, cair, levantar, andar, nausear, vomitar, beber uma água de coco e sentar novamente na areia. Vamos levar você para casa e divulgar seu desaparecimento ao mundo, disse a senhora idosa com cara de Dona Benta do Sítio do Pica-pau Amarelo.
Chegou na casa do casal com cara de nunca mais. Nunca mais ia tomar banho de mangueira com sua cachorrinha Nina, que pulava feito louca no vazio do ar e depois se sacudia, distribuindo jatos de água e de pulgas. Nunca mais contaria as estrelas fluorescentes adesivadas no céu de seu quarto, nunca mais comeria bolo-pudim, nunca mais receberia sermões de seu pai por colocar os pés na mesa da sala de aula e de responder à professora com mais e mais porquês. Nunca mais tantas coisas pairavam naquela cabecinha de sete anos, e a velocidade de imagens fluía com a mesma densidade das lágrimas de seus olhos. A única coisa que ele via era tudo que não gostaria de ver.
O velhinho Pascoal, com cara de Visconde de Sabugosa das mesmas histórias de Monteiro Lobato, chamou o menino para o noticiário da tevê. A jornalista relatava o nome e a descrição da criança perdida com o telefone para contato. E aquele aparelho telefônico preto com teclas de disco não era mais apenas um telefone. Era o centro do universo, e seu silêncio ensurdecia os ouvidos da criança que, de tão concentrada com os olhos fixados naquele objeto em cima da escrivaninha de vime, ouvia apenas as vozes da sua momentânea loucura de falar em pensamento frases desconexas. É necessário lembrar que o telefone não tocava. E foi assim durante duas horas e quarenta e três minutos. Tocou. E para tristeza daquela alminha sardenta e dentuça, quando alguém ligou era para perguntar se, caso encontrasse os pais da criança, receberia alguma recompensa. Pascoal devolveu dizendo que não sabia que urubu falava e bateu o telefone.
Engolido por uma camisa listrada de malha piquê e ao lado de um saquinho de supermercado com sua sunga molhada, ele apagou no sofá. Dormia e babava e até em sonhos estava na mesma posição de cão-de-guarda do telefone. E dormindo sentia o tempo passar e despassar. Sentia o vazio de um desejo cheio de desesperança. Sentia a mão fria e sedosa de uma senhora dizendo acorde, meu filho, seus pais ligaram e estão vindo pegar você. Correu até a porta do apartamento e parou de repente. Sentiu falta de si mesmo. Foi até a geladeira, pegou o cachorro-quente embalado com alumínio amassado e cheio de areia e correu até o elevador, onde as portas se abriram para um mundo que por um instante, um eterno momento de instante, parecia não ter fim.
Olhou para o pedaço de cachorro-quente na mão e pensou Papai do Céu, agora só tenho isso para comer pelo resto da minha vida. Fez uma trouxinha com o papel laminado ao redor do seu lanche e o segurou firme como seu talismã da sorte. Apertava com cuidado seu alimento para a alma, a única coisa que lembrava seus pais e a possibilidade de se sentir com eles, de não parecer estar tão sozinho. Minha mãe está aqui comigo, pensava. Nenhuma presença se faz mais concreta do que a lembrança exata de quem mora dentro da gente.
Depois de meia hora sentado e de sentir o ardor do sol na sua pele amarela e fina de pêssego, um casal de idosos vê aquele infante olhando sozinho para o infinito. A pergunta sobre os pais de Xandinho foi seguida de braços abertos e de uma cara de não sei. Partem todos em busca do tão esperado encontro que só precisava acontecer. O garoto começa andar, andar, andar, cansar, cair, levantar, andar, nausear, vomitar, beber uma água de coco e sentar novamente na areia. Vamos levar você para casa e divulgar seu desaparecimento ao mundo, disse a senhora idosa com cara de Dona Benta do Sítio do Pica-pau Amarelo.
Chegou na casa do casal com cara de nunca mais. Nunca mais ia tomar banho de mangueira com sua cachorrinha Nina, que pulava feito louca no vazio do ar e depois se sacudia, distribuindo jatos de água e de pulgas. Nunca mais contaria as estrelas fluorescentes adesivadas no céu de seu quarto, nunca mais comeria bolo-pudim, nunca mais receberia sermões de seu pai por colocar os pés na mesa da sala de aula e de responder à professora com mais e mais porquês. Nunca mais tantas coisas pairavam naquela cabecinha de sete anos, e a velocidade de imagens fluía com a mesma densidade das lágrimas de seus olhos. A única coisa que ele via era tudo que não gostaria de ver.
O velhinho Pascoal, com cara de Visconde de Sabugosa das mesmas histórias de Monteiro Lobato, chamou o menino para o noticiário da tevê. A jornalista relatava o nome e a descrição da criança perdida com o telefone para contato. E aquele aparelho telefônico preto com teclas de disco não era mais apenas um telefone. Era o centro do universo, e seu silêncio ensurdecia os ouvidos da criança que, de tão concentrada com os olhos fixados naquele objeto em cima da escrivaninha de vime, ouvia apenas as vozes da sua momentânea loucura de falar em pensamento frases desconexas. É necessário lembrar que o telefone não tocava. E foi assim durante duas horas e quarenta e três minutos. Tocou. E para tristeza daquela alminha sardenta e dentuça, quando alguém ligou era para perguntar se, caso encontrasse os pais da criança, receberia alguma recompensa. Pascoal devolveu dizendo que não sabia que urubu falava e bateu o telefone.
Engolido por uma camisa listrada de malha piquê e ao lado de um saquinho de supermercado com sua sunga molhada, ele apagou no sofá. Dormia e babava e até em sonhos estava na mesma posição de cão-de-guarda do telefone. E dormindo sentia o tempo passar e despassar. Sentia o vazio de um desejo cheio de desesperança. Sentia a mão fria e sedosa de uma senhora dizendo acorde, meu filho, seus pais ligaram e estão vindo pegar você. Correu até a porta do apartamento e parou de repente. Sentiu falta de si mesmo. Foi até a geladeira, pegou o cachorro-quente embalado com alumínio amassado e cheio de areia e correu até o elevador, onde as portas se abriram para um mundo que por um instante, um eterno momento de instante, parecia não ter fim.
Um comentário:
Gracinha, Bruno!
Adorei! Deu tanta peninha! Da primeira vez, li correndo pra ele encontrar logo os pais...
Muito legal!
Parabéns!
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