Aprendizados em campo aberto, aprendizados em ômegas, betas e betos, entre pinheiros e abetos, rios, correntezas, correntes de elos e não prisões… aprendizados abertos ao horizonte, inatingíveis objetivos vitais… aprendizados que desdizem o não e tiram o melhor do sim, que nos deixam sós e depois assim-assim tão melhores… aprendizados que não justificam a vida por serem ela por si mesma.
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2 comentários:
Comentário por Bruno D´Almeida — 11 janeiro 2009 @ 22:32
Por um mundo depois das nove
Fábio Tanajura acordou tarde naquela manhã. Estafa, estresse, canseira, irritação constante, dois xingamentos ao colega de trabalho e uma falta de ereção com a esposa o levaram a procurar ajuda. Estava doente e recebeu calmantes, daqueles que deixam a pessoa lerda com espasmos escorrendo pelo cantinho da boca, um atestado médico com recomendações de durma bem e estima de melhoras. Depois de vinte anos madrugando para chegar ao trabalho no horário, mais quinze de escola funcionando ao nascer do sol, sentiu a sensação de acordar sem horário determinado. Estava um pouco melhor. Correu para o computador e mandou ver:
Eu odeio acordar cedo. Fico o dia inteiro com sono. De que adiantar cumprir um horário tão chatinho e descumprir o direito augusto de viver bem? Passei minha vida inteira cumprindo com minhas obrigações e descumprindo os objetivos que tracei para mim. Tudo que tenho a fazer é viver como uma máquina de produção de força de trabalho com sentimentos amordaçados? Nada de poesia e de nostalgia, nada de pensar que sou gente e que posso acordar naturalmente? Sinto-me tão depressivo em levantar no horário que acordo antes do despertador só para ter o prazer de desligá-lo
Os bancos abrem às dez horas. Muitas agências de publicidade começam a funcionar às nove. Os shoppings também abrem às nove. O comércio abre a partir das oito da manhã. Por que diabo as escolas começam a funcionar às sete horas da madrugada? Uma crueldade sem tamanho fazer uma criança ou adolescente acordar às cinco, sair de casa às seis e vegetar sentado na cadeira no horário previsto. Dizem que é pra criar disciplina. Acho que cria muito mais remela nos olhos e bocejos de vitamina de banana com chocolate.
Ao acordar cedo demais, deixamos de contemplar a beleza das coisas. Fazemos tudo no automático. Imaginem milhões de beijos automáticos de bom dia flor do dia sem o menor amor acontecendo neste exato momento em algum lugar do mundo. Muita gente se deprime por causa disso e recorre a coisas esdrúxulas. O cidadão adoece diante do desejo de se libertar das amarras do tempo comportado. Por isso muita gente acaba aderindo a uma seita fabricada em manuais de auto-ajuda, que fazem uma lavagem cerebral e deixam você gritando de manhã cedo coisas do tipo bom dia plantinha, bom dia mundo, bom dia qualquer porcaria. Até a tentativa forçada de libertação para horários tão malucos para acordar semeia a insanidade.
Sou a favor de um mundo que comece depois das nove. As pessoas acordariam às sete, no máximo, e chegariam tranqüilas ao curso de suas vidas. Imagine uma legião de pessoas sorridentes, libertadas de acordar com as galinhas. Imagine tirar as olheiras horrorosas do rosto. Lembre-se que toda olheira é um pé-de-galinha em potencial. Vamos gastar menos dinheiro com cremes.
Por isso estou criando o movimento consciente pelo ócio. Sem pressas de carros, ônibus, metrô e motocicletas, todos os meios de transporte querem acelerar o mundo, mas o máximo que conseguem é uma profusão de engarrafamentos e tudo fica devagar às avessas. O mundo não agüenta a rapidez da velocidade paranóica e simplesmente pára. E causa mais irritação. Por que não assumimos conscientemente que podemos fazer tudo bem e devagar? Pense um pouco sobre isso.
Tanajura terminou o texto, leu, releu, tirou os erros de ortografia, releu, lambeu e lambeu a cria, sua jóia rara da humanidade, pegou sua lista de contatos do correio eletrônico e mandou para todo mundo solicitando que fizessem o mesmo. Ainda disse que se todos fizessem isso, em cinco dias o mundo se tornaria um canteiro de felicidade e que qualquer um tinha o dever de cumprir sua missão de um mundo melhor.
Alguns depois responderam que ele deveria parar com a mania de abarrotar suas caixas de mensagens com textos açucarados e utópicos, mas Tanajura nem ligava. Naquele dia, talvez somente naquele dia, ele sentia um misto de alegria comedida e sensação de dever cumprido, assistindo televisão às dez da manhã. Dava risadas sozinho e anotava a receita de creme de frango com brócolis que passava na telinha.
Bruno D´Almeida - comendocomfarinha.blog.terra.com.br
Comentário por Ana — 18 janeiro 2009 @ 11:49
Raquel, adorei o texto! Final brilhante!
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