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.Era um dia de jogo e, como já virou tradição em casa, lá estávamos meu pai e eu na sala, cada um em sua poltrona, vendo o Imortal em campo. De repente, o juiz apita escanteio em um daqueles lances que não deixam dúvidas – é claro que é tiro de meta. As consequências foram proporcionais ao tamanho do erro: gol para um lado, expulsão para o outro. Mesmo com meu time favorecido, achei aquilo um absurdo, e acabei transparecendo minha indignação.
– Vais torcer contra?
É, era meu pai me xingando. Perguntei se ele iria fazer daquilo uma briga.
- Não, porque, se tu vai torcer contra, eu saio da sala!
Estava instaurado o famoso “clima”. O resto do jogo se passou em silêncio, enquanto eu me perguntava para onde teriam ido todos os valores de justiça e de ganhar limpo que ele mesmo, meu pai, tinha me ensinado. Será que eles podiam ser simplesmente jogados para baixo do tapete durante 90 minutos por semana, e depois pegos de volta, como algum sapato apertado?
Não foi a primeira vez que arranjei discussão pelo meu modo racional de torcer. Torcedor não costuma ser assim: é emocional, impulsivo e inevitavelmente parcial. Avalia lances iguais de maneiras estranhamente diferentes, conforme o interesse. Utiliza argumentos e os rebate com o mesmo fervor. Nutre um ódio pela equipe rival de uma maneira tão pré-uterina como o amor que sente por sua mãe.
Não que seja necessariamente uma má pessoa. Muitas vezes é o funcionário exemplar, o bom pai, o estudante regular. Basta o apito do juiz, e a coerência é mandada para o espaço; a interpretação vira a mais maleável das armas; o coração passa a mandar, ao menos até o próximo apito final. Mas por quê?
A verdade é que ser certinho cansa. Por mais que viver dentro dos valores seja mais uma questão interior do que obrigação para muitas pessoas, nem todos têm a mesma visão da realidade. Sentir que está perdendo oportunidades por agir corretamente, enquanto vê os outros se beneficiando, pode ser bem incômodo, mas não há como agir de outro jeito: ir contra a própria natureza traria peso na consciência.
Entretanto, o futebol é um mundo a parte. Um mundo que se abre e se encerra com um apito, e que é regido por suas próprias leis. Um mundo ao qual o torcedor pertence, se envolve, mas vê tudo de fora, com o poder de julgar e a impotência de não alterar o resultado. Nesse mundo, o torcedor pode largar todas as suas máscaras, soltar-se da linha reta que o prende, e liberar um pouco o seu instinto, sem, com isso, trazer quaisquer consequências. Dentro da dimensão dos 90 minutos, o torcedor pode livrar-se do peso de suas decisões, e ser um pouco egoísta.
E a justiça? Pode esperar até o fim do jogo...
– Vais torcer contra?
É, era meu pai me xingando. Perguntei se ele iria fazer daquilo uma briga.
- Não, porque, se tu vai torcer contra, eu saio da sala!
Estava instaurado o famoso “clima”. O resto do jogo se passou em silêncio, enquanto eu me perguntava para onde teriam ido todos os valores de justiça e de ganhar limpo que ele mesmo, meu pai, tinha me ensinado. Será que eles podiam ser simplesmente jogados para baixo do tapete durante 90 minutos por semana, e depois pegos de volta, como algum sapato apertado?
Não foi a primeira vez que arranjei discussão pelo meu modo racional de torcer. Torcedor não costuma ser assim: é emocional, impulsivo e inevitavelmente parcial. Avalia lances iguais de maneiras estranhamente diferentes, conforme o interesse. Utiliza argumentos e os rebate com o mesmo fervor. Nutre um ódio pela equipe rival de uma maneira tão pré-uterina como o amor que sente por sua mãe.
Não que seja necessariamente uma má pessoa. Muitas vezes é o funcionário exemplar, o bom pai, o estudante regular. Basta o apito do juiz, e a coerência é mandada para o espaço; a interpretação vira a mais maleável das armas; o coração passa a mandar, ao menos até o próximo apito final. Mas por quê?
A verdade é que ser certinho cansa. Por mais que viver dentro dos valores seja mais uma questão interior do que obrigação para muitas pessoas, nem todos têm a mesma visão da realidade. Sentir que está perdendo oportunidades por agir corretamente, enquanto vê os outros se beneficiando, pode ser bem incômodo, mas não há como agir de outro jeito: ir contra a própria natureza traria peso na consciência.
Entretanto, o futebol é um mundo a parte. Um mundo que se abre e se encerra com um apito, e que é regido por suas próprias leis. Um mundo ao qual o torcedor pertence, se envolve, mas vê tudo de fora, com o poder de julgar e a impotência de não alterar o resultado. Nesse mundo, o torcedor pode largar todas as suas máscaras, soltar-se da linha reta que o prende, e liberar um pouco o seu instinto, sem, com isso, trazer quaisquer consequências. Dentro da dimensão dos 90 minutos, o torcedor pode livrar-se do peso de suas decisões, e ser um pouco egoísta.
E a justiça? Pode esperar até o fim do jogo...
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Visitem Gio
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Um comentário:
a propósito meu caro Gio, um link para torcedores do Grêmio.
http://www.youtube.com/results?search_query=tricoloresfontoura&aq=f
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