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Preparar, apontar... Morte ao tirano. Homens fuzilem-no! (1, 2...) Descansar armas. Ascendam a pira funerária ou deixem o corpo aos cães. (1, 2...) E algumas horas mais tarde, histeria coletiva... Saudações ao novo tirano! Ele já esperava pelo desjejum na sala de jantar. Sirvam-lhe carne e sangue se disso é composto o triunfo. Um cai e outro ascende, e esse também enfrenta a derrocada pra que um outro mais astuto venha. (1, 2...) Bola da vez, o eterno samsara do concurso mundial de vaidades. Seja rápido! Ou lento o bastante, pra que as sentinelas do caos te acertem no peito.
O problema humano não é político mas, antes de qualquer outro, um problema ético. Enquanto não houver um sentido de coerência de ação entre homens nada se fará tão pragmático como a inabilidade das buscas coletivas em produzir algo de bom ou justo. A consciência do senso comum é nascente como espelho da conjuntura em que se vive. Assim, há que se supor que enquanto o aviltamento do ser humano em seu sentido mais elevado for distribuído por meio de teorias, dissimulações e forja daqueles a quem cabe ditar um caminho na tecnocracia do mundo atual, todo o mais que se constrói a sua borda resultará inútil. A escola não ensina, a política não governa, o exército não protege, a TV não informa. As assim ditas redes de manutenção e formação da ordem social constituem só uma forma sofisticada do velho desejo de manter o homem médio anestesiado. Aquele homem bate mais uma vez à sua porta, vez em quando a capa do sacerdote, do candidato, do capitão, do professor ou do jornalista, vez em sempre o desejo frenético de te manter suficientemente submisso. Nada de novo pode ser produzido sem que o mestre ordene, isso seria uma subversão perigosa. Então a busca de um progresso inclusivo ofusca os olhos de teu amo. Morra como um cão! Ou vomite seu ressentimento na cara desses guias cegos. Eles te fizeram refém por muito tempo, é hora de acordar. O sol brilha lá fora, que ninguém nos cobre mais por esses raios. Expurgue de uma vez o seu medo e a sua escravidão, já é hora de tentar algo novo. E até que esse algo inédito apareça, nenhum comunismo, nenhum paganismo, nenhum filosofar profundo... Nada será capaz de restituir ao homem aquilo que desde sempre lhe sentiu usurpado. É preciso mergulhar mais fundo, vasculhar escombros, caminhar no subterrâneo de si próprio. Vá agora àquele quarto desabitado, acorde sua alma, chame-a pra dançar. Contemple em silêncio, comemore aos berros. És o soberano de teu próprio ser! Respire fundo, avance a passos confiantes. Siga até a fenda aberta entre o animal e o algo superior, costure-a com os dentes, reequilibre as partes. Una em si tudo o que é mundo disse impossível. Cuspa nos arremedos da vida, tenha a versão original. Um novo livro foi lançado, uma nova ideologia criada. Livros são suportes de palavras que são suportes de elevação a quem sabe usá-las. Ideologias são suportes de ideias que são suportes dos mais hábeis demagogos. Uma crença é semelhante a um instrumento de corte nas mãos de um homem, se ele é um cirurgião procurará curar com sua cirurgia, se é um açougueiro, maquinalmente decepará as partes que estiverem à sua frente. A questão fundamental está ligada àquilo a que cada um se propõe. Posso ser um socialista que não divide ou um capitalista que crê no altruísmo. Um homem-bomba que detona bombas de confete, um judeu que crê na humanidade como povo escolhido. E é isso que sou e é isso que podemos ser, habita em mim essa contradição vacilante. Um homem sem bandeira, credo ou partido. Que o vento seja gentil, que nossas velas inflem rumo ao desconhecido. E que nesse nos reconheçamos como criaturas livres. A noite passou como um vulto, enfim vem se aproximando a aurora. É hora de partir, é hora de ficar, é tempo de transcender.
Visitem Leandro M. de Oliveira
Um comentário:
Leandro:
Clap! Clap! Clap! Parabéns! Transcendeu neste texto!
Concordo plenamente com você: é tempo de transcender.
Beijo.
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