Olhando para o teto da cama, Daniel Limeira relembrou o momento em que encontrou uma pessoa do passado na rua. Foram cinco intermináveis segundos até o sinal abrir. E ele lembrou mais ainda, mais do que gostaria. Aquela mulher recebeu a maior declaração de amor que ele fora capaz de fazer. Mas é o seguinte: essa história não tem final feliz. Tem certeza de que precisa relembrar? Daniel mandou seu anjo-diabo da guarda calar a boca.
Primeira viagem dos noivos. Ela dá a ideia de colocarem as alianças na mão esquerda e fazerem de conta de que já são casados assim que entrassem no avião. Ele obedece prontamente, mas tem uma ideia melhor. Vai ao banheiro, escreve um bilhete para o comandante do voo:
Esta é a lua de mel de Daniel e Maria Rita. Por favor anuncie boas-vindas para nós.
Pronto, só bastava isso. Entraram com as alianças na mão esquerda. Atrás de Rita, Daniel entregou o bilhete à aeromoça, que recebe o papel desconfiada, provavelmente achando que se tratava de algum terrorista. Devidamente acomodados no Boing 737 da Varig, começam a tirar as fotos de recordação ali mesmo. Chega a comissária de bordo com cara de poucos amigos. Meus senhores, disse ela, devido a um overbooking, houve duplicidade na venda de assentos. Os senhores precisam se levantar imediatamente.
Barraco. Não sabia que uma moça tão fina e requintada, moradora da Ladeira da Barra, pudesse falar aquela quantidade de palavrões. Aprendi alguns, inclusive. Criatura ignóbil. Sacripanta. Levantamos, ela furiosa batendo os tamancos atrás da aeromoça, que ia dizendo minha senhora, tenha calma, isso acontece, mas não se preocupe, vamos fazer o possível para resolver este problema. O que estou tentando dizer aos senhores é que seus lugares foram devidamente transferidos… para a primeira classe.
Ritinha não sabia se morria de vergonha pelo barraco ou pela alegria da surpresa. Suplicou duzentos e noventa e quatro pedidos de desculpas para uma comissária que, pelo visto, não aceitou nenhuma delas e saiu com cara de quem ajuda todo mundo e só recebe coice. Ao sentarem naquela poltrona azul grande, confortável e imponente, o comandante falou pelo microfone: senhoras e senhores, este é o voo 7257 de Salvador com destino a Fortaleza. Dia lindo de sol. Eu sou comandante Rodrigo Lopes, desejo a todos uma boa viagem. Gostaria de parabenizar o casal Daniel e Maria Rita pela lua de mel. Faremos o possível para tornar este momento inesquecível.
Nem sabia que um avião podia servir champanha em taças de cristal. Mas era verdade. Era verdade também o prato de costeletas de cordeiro com creme de maracujá. De dez em dez minutos, o comandante felicitava o casal. Maria Rita já havia acabado com todos os lenços de papel de tanto chorar. Até mesmo na hora de avisar que o avião daria voltas em loop por quinze minutos antes de começar a aterrissagem, por conta de uma chuva forte de verão, ele felicitou o casal. Desceram. Chegaram. Foi tudo lindo, cinco dias de felicidade. Comemoraram intensamente um matrimônio que nunca existiu de verdade. Acabou sem nunca ter sido.
Daniel acendeu a luz, pegou a agenda de telefones, leu um número que lembrou ter decorado uma vez e ligou. Enquanto chamava, pensava em todas as besteiras que fizeram depois, tanta imaturidade que desfizeram uma história sem fim ter fim. Ela atendeu. Ele não teve coragem de falar. Ela também não disse nada. Sabiam exatamente quem estava do outro lado da linha. Desligaram. O simples fato de jurarmos esquecimento perpétuo de uma lembrança demonstra nossa incapacidade de esquecê-la. Ele apagou a luz, mas manteve seus pensamentos acesos por toda a madrugada.
Primeira viagem dos noivos. Ela dá a ideia de colocarem as alianças na mão esquerda e fazerem de conta de que já são casados assim que entrassem no avião. Ele obedece prontamente, mas tem uma ideia melhor. Vai ao banheiro, escreve um bilhete para o comandante do voo:
Esta é a lua de mel de Daniel e Maria Rita. Por favor anuncie boas-vindas para nós.
Pronto, só bastava isso. Entraram com as alianças na mão esquerda. Atrás de Rita, Daniel entregou o bilhete à aeromoça, que recebe o papel desconfiada, provavelmente achando que se tratava de algum terrorista. Devidamente acomodados no Boing 737 da Varig, começam a tirar as fotos de recordação ali mesmo. Chega a comissária de bordo com cara de poucos amigos. Meus senhores, disse ela, devido a um overbooking, houve duplicidade na venda de assentos. Os senhores precisam se levantar imediatamente.
Barraco. Não sabia que uma moça tão fina e requintada, moradora da Ladeira da Barra, pudesse falar aquela quantidade de palavrões. Aprendi alguns, inclusive. Criatura ignóbil. Sacripanta. Levantamos, ela furiosa batendo os tamancos atrás da aeromoça, que ia dizendo minha senhora, tenha calma, isso acontece, mas não se preocupe, vamos fazer o possível para resolver este problema. O que estou tentando dizer aos senhores é que seus lugares foram devidamente transferidos… para a primeira classe.
Ritinha não sabia se morria de vergonha pelo barraco ou pela alegria da surpresa. Suplicou duzentos e noventa e quatro pedidos de desculpas para uma comissária que, pelo visto, não aceitou nenhuma delas e saiu com cara de quem ajuda todo mundo e só recebe coice. Ao sentarem naquela poltrona azul grande, confortável e imponente, o comandante falou pelo microfone: senhoras e senhores, este é o voo 7257 de Salvador com destino a Fortaleza. Dia lindo de sol. Eu sou comandante Rodrigo Lopes, desejo a todos uma boa viagem. Gostaria de parabenizar o casal Daniel e Maria Rita pela lua de mel. Faremos o possível para tornar este momento inesquecível.
Nem sabia que um avião podia servir champanha em taças de cristal. Mas era verdade. Era verdade também o prato de costeletas de cordeiro com creme de maracujá. De dez em dez minutos, o comandante felicitava o casal. Maria Rita já havia acabado com todos os lenços de papel de tanto chorar. Até mesmo na hora de avisar que o avião daria voltas em loop por quinze minutos antes de começar a aterrissagem, por conta de uma chuva forte de verão, ele felicitou o casal. Desceram. Chegaram. Foi tudo lindo, cinco dias de felicidade. Comemoraram intensamente um matrimônio que nunca existiu de verdade. Acabou sem nunca ter sido.
Daniel acendeu a luz, pegou a agenda de telefones, leu um número que lembrou ter decorado uma vez e ligou. Enquanto chamava, pensava em todas as besteiras que fizeram depois, tanta imaturidade que desfizeram uma história sem fim ter fim. Ela atendeu. Ele não teve coragem de falar. Ela também não disse nada. Sabiam exatamente quem estava do outro lado da linha. Desligaram. O simples fato de jurarmos esquecimento perpétuo de uma lembrança demonstra nossa incapacidade de esquecê-la. Ele apagou a luz, mas manteve seus pensamentos acesos por toda a madrugada.
Visitem Bruno D’Almeida
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Um comentário:
Demais, Bruno!
Muito boa!
Adorei!
Um abraço!
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