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segunda-feira, 6 de abril de 2009

Paulo Sérgio Duarte em “O que Constrói e Educa uma Sociedade” - Enviado por Rodrigo de Souza Leão

É muito difícil escrever para um órgão da imprensa - não se trata do catálogo da exposição ou de um informe de divulgação - sobre uma exposição de arte da qual você não apenas participou como um dos organizadores, mas coordenou toda uma equipe de quatro curadores e oito assistentes. Tratando-se de arte na qual os juízos são sempre subjetivos não existe ninguém mais suspeito do que eu para falar dessa exposição porque o leitor, naturalmente, espera, ao ler o jornal, uma avaliação crítica. Peço que a visite e a avalie por si mesmo.
Tratando-se de uma escolha que não é pessoal, mas de uma equipe de treze pessoas, posso apenas garantir que se trata de uma relevante amostragem da produção de artes visuais do Brasil contemporâneo de Norte a Sul, de Leste a Oeste. E um evidente testemunho da vitalidade dessa produção que há muitos anos nos coloca de igual para igual com o que de melhor se faz no planeta. E depois dessas afirmações, vejam como não sou suspeito.
Mas é importante essa oportunidade para informar o leitor do que se trata o programa Rumos Itaú Cultural Artes Visuais. E quem lhes escreve dirigiu órgãos públicos federais, estaduais e municipais, e tem alguma experiência com entidades privadas. Hoje, o Rumos Artes Visuais é o mais importante programa realizado por meio de um edital público na área de artes visuais voltado especialmente à produção emergente. Nenhum outro órgão público ou privado desenvolve um programa como esse.
Nessa edição 1617 artistas se inscreveram. Quarenta e cinco foram selecionados. Os artistas selecionados recebem recursos criteriosamente estabelecidos para realizar suas obras quando estes são necessários. Mas não é mais um salão de arte. Muito além do concurso público e da exposição que agora pode ser visitada, o programa é todo um processo complexo e variado.
Percorre o País em diversas cidades do Norte ao Sul, promovendo conferências e debates, visita ateliês, entra em contato com os artistas, distribui livros para enriquecer bibliotecas com títulos de arte, realiza oficinas de trabalho, promove seminário e bolsas de residência no exterior e no país. Acima de tudo, promove um intercâmbio de experiências entre artistas, curadores, críticos; cada edição do Rumos Artes Visuais é um encontro, em muitos capítulos, que dura dois anos. A exposição ora apresentada em São Paulo receberá quatro recortes por cada um dos quatro curadores - Alexandre Cerqueira, de Belém; Marília Panitiz, de Brasília; Christine Melo, de São Paulo e Paulo Reis, de Curitiba - e será exibida em Rio Branco, no Acre, em Brasília, em Salvador e em Curitiba, e, depois, será mostrada na íntegra no Rio de Janeiro. Os artistas selecionados têm uma ocasião única de ter sua obra em contato com um público muito variado.
Agora vem o momento crítico: e para quê tudo isso? A mentalidade instalada no poder em nosso País, e isto não agora, mas desde nossa fundação, não compreendeu o papel da arte na construção de uma nação. No nosso caso de País periférico a indústria do entretenimento pegou pesado por meio da televisão. Produzimos uma das melhores televisões abertas do mundo. Mas lembre-se, a meu ver, apenas um canal aberto apresenta alta qualidade de conteúdo e forma, o resto é sofrível quando não deprimente.
Esse canal de melhor audiência e qualidade desenvolve um trabalho cultural evidente, criticável em alguns aspectos, mas de longe uma das melhores coisas que já vi quando sintonizo a TV nos hotéis em qualquer País. Mas arte não é só cultura, e muito menos cultura eletrônica. É isto que a elite brasileira não introjetou, não botou para dentro. As castas superiores da sociedade brasileira têm uma enorme dificuldade em diferenciar arte de cultura. E tanto faz castas de esquerda e de direita, todas pensam igual.
Pode ser que alguém pergunte: mas o que esse cara entende por casta? Entendo por casta no Brasil esse ajuntamento de proprietários, de investidores pesados. Seus assessores e, sobretudo, essa burguesia de Estado formada por tecnocratas e recém-chegados ao poder que ocuparam desde os fundos de previdência das estatais até órgãos da cultura. Esta é a casta superior da sociedade brasileira. É esta casta que não diferencia arte de cultura. E não interessa diferenciar porque cultura - esta coisa genérica - rende politicamente, arte é mais complicado.
Não vou falar da Europa, porque vou ser considerado muito antigo. Vamos aos Estados Unidos que têm a maior indústria cultural do mundo: Hollywood, a Broadway, as maiores redes de TV e uma produção imensa de pacotes de exportação. O que eles fazem? Exportam indústria cultural, entretenimento e importam arte. Têm absoluta ciência do papel da arte na construção de uma nação. Basta pensar nos seus maiores museus.
Em Merion, na Barnes Foundation, um subúrbio da Filadélfia, entre outras preciosidades existem 52 óleos de Cézanne, repito, 52 de Cézanne. Não falemos de Washington, Nova York, Filadélfia ou Chicago. O país que deu ao mundo o blues, o jazz e o rock não abdicou de formar grandes coleções de arte. Por quê? Sem confundir arte com cultura os norte-americanos sabem o que constrói e educa uma sociedade.
Em nosso País é deplorável a situação das artes visuais. Passados 13 presidentes da República entre ditadores e democratas - não contando os dois interregnos - o Museu de Arte de Brasília é a antiga sede do Clube das Forças Armadas, depois transformada em Casarão do Samba, para, finalmente ser destinada ao Museu. Vive, em lugar ermo, ao lado de um conjunto hoteleiro de arquitetura pífia chamados, et pour cause, de Fort Lauderdale e Key Biscayne.
O Rumos Itaú Cultural Artes Visuais faz todo esse trabalho, para quê? Para ser complementado por programas públicos de bolsas de trabalho para artistas e programas de aquisições de obras de arte para enriquecimentos de acervos nacionais e locais. Mas para isso é preciso abrir o olho para a arte e diferenciá-la da cultura. E sobretudo parar com a discurseira reformista e fortalecer o que está dando certo.



Paulo Sérgio Duarte é curador-coordenador do Rumos Itaú Cultural Artes Visuais
e da mostra Rumos Artes Visuais - Trilhas do Desejo.
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Fonte: Gazeta Mercantil, Fim de Semana, p. 5, 03/04/09
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Um comentário:

Ana disse...

Muito legal o artigo, Rodrigo!
Gostei.
É isso aí!