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terça-feira, 27 de outubro de 2009

Livre! - por Leandro M. de Oliveira

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E se Deus for só um fetiche? Uma coisa que os homens inventaram para se sentirem menos impotentes frente ao pasmo da vida e mais tarde o mercado (única divindade realmente sensível) apropriou-se dele como um produto que se autopromove, um negócio de poucos investimentos e lucros exorbitantes. As pessoas morrem de fome, ignorância, aids... e os bispos alegres e remotos ainda a viver em seus palacetes, e os pastores abstraídos e dissimulados em suas lanças ou iates. Tudo é uma farsa. A utopia cristã do altruísmo serve só a quem se beneficia da indulgência dos humildes. O que resta disso é um contínuo engodo, uma coisa construída e reinventada ao longo dos séculos, pra que a sua anestesia dure mais. As religiões foram, sem exceção, erguidas através de dogmas forjados. Seria talvez um ato de lucidez inconveniente pensar que no decorrer desse culto à mentira o homem esteja ajoelhando-se perante Satanás chamando-o de Senhor. É possível. Todavia não creio nisso como algo sujo em relação à pessoa, toda servidão é em essência blasfema à vida em si. Os homens deveriam viver como leões, isso seria respeitoso para com a natureza, mas alguém disse sobre ser como ovelhas. Um tedioso e monocromático rebanho ao bel-prazer de um leão travestido de carneiro chefe. Todos acharam isso fantástico. Pelo menos é o que minha avó tentava me dizer na infância, claro, com outras palavras. Bem-aventurados os simplórios, pois deles será o reino das noites bem dormidas. Enquanto andava pelas ruas vazias da cidade dava incessantemente graças à força invisível (que nem sei se existe) pelo nascimento de todos os transgressores da história. A mim, morrer com ideias frustradas parece ainda mais atrativo que viver como uma prostituta, talvez seja coisa da idade. O que há de divino no homem ainda não foi vislumbrado, as pessoas admiram demais as ornamentações nos jardins do templo, mas esquecem-se de examinar o que há sobre o altar. De qualquer forma, entre outdoors e reflexões os primeiros sempre foram considerados menos cansativos. O que foi feito da raça humana? A revolução científica, o renascentismo, o iluminismo, todos os ismos produzidos na minúscula história humana à qual alguns reivindicam uma grandeza infinda. Todos eles e toda ela são testemunhas cabais da miséria coletiva. A ânsia pelo inatingível, pela felicidade que não perece.
E a cada dia um novo messias propõe as fantasias mais obscenas ao povo, venha ele em forma de pessoa, ideologia ou sistema político. A observação empírica mostra: durante o amanhecer até mesmo um anão projeta grandes sombras. Vivemos em uma era ainda muito primitiva, a fantasia domina, o avaro é seguido como tendência de moda. Por que se preocupar? Mais algum dinheiro no cesto e alguns minutos de joelho são suficientes, amanhã estaremos todos no paraíso. A redenção tornou-se tão prática quanto macarrão instantâneo. Enquanto a maioria faz apoteose aos mistérios desvelados, sinto náuseas toda a vez que se mos oferecem. Pode ser que o preço da liberdade seja o vômito involuntário.
Enquanto isso nas escolas, nos quartéis, nas igrejas e nas casas as pessoas vão mentindo a si mesmas. Tudo pela prosperidade do pacto social, aquele mítico documento do qual ninguém nunca me apresentou uma linha do conteúdo. Agostinho de Hipona foi um homem, foi uma pessoa difícil; ao se acovardar do próprio intelecto disse a célebre frase: “Credo quia absurdum” isso ecoa com gravidade em nossos tempos. De qualquer forma há um mistério insondável, o fato do ente humano preferir acreditar no absurdo e no improvável em prejuízo à análise do óbvio. Será a transição do macaco para o homo sapiens uma feita inconclusa? Talvez eu seja um pássaro que perdeu as asas, talvez uma estrela decaída. Tente não pensar nisso, tente não comer tanta coisa industrializada. A vida é mais que isso e menos que qualquer outra coisa. Ouso por ser efêmero, sou imortal por acreditar no agora. Ninguém vai te salvar por piedade, procure oferecer algo em troca. Não quero a onipotência de um velho sentado em um trono, não preciso do estático do sempre. Quero a vida, quero o rastro do que se esvai à medida que os instantes vão passando. Pra mais tarde, quem sabe se reinventar ou ainda, se perder no oco do tempo de uma vez por todas. E disso sou feito, de delírio e sonho. De delírio crença na diferença, de sonho espera no agora. Enquanto os outros riem pelas planícies eu grito no alto dos montes. A esquizofrenia é meu veneno tanto quanto meu antídoto. Sou normal? Não, não quero ser. Prefiro estar apenas liberto. Prefiro acordar de noite e dormir de dia.


Santo Agostinho.

Um comentário:

Ana disse...

Leandro:
Quanto mais o leio, mais certa estou de que pertencemos à mesma turma de esquizofrênicos. Graças ao Fetiche! (ou apesar dele) rsrsrs
Beijo.