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sábado, 12 de setembro de 2009

Memórias de um Seminarista (Parte XIV) - por Paulo Chinelate

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MUDANÇAS


Foi um bom ano. Por ter repetido o ano letivo, passei pelo “admissão” com ótimo proveito.
Os acontecimentos mundiais seguidos pela rádio-eletrola da sala de estudos nos trouxe as notícias da eleição e renúncia de Jânio Quadros. A Alemanha levanta o muro de Berlim, único buraco existente na “cortina de ferro”. Os Estados Unidos não conseguiram derrubar Fidel Castro com a investida da “Baía dos Porcos”.
Os eventos de final de ano repetiram-se espetaculares. Acresça-se às festas de formaturas, congratulatórias e passeios, o tão esperado leilão. Não fiquei atrás na pontuação adquirida durante o ano. As notas mensais das disciplinas bem como alguns títulos de campeão em futebol (eu sou goleiro), participação em caça às cobras e insetos me facilitaram poder arrematar lindas prendas no leilão. Muitos dos prêmios já têm destino certo: meus irmãozinhos em Juiz de Fora. Vou viajar de férias. Depois de dois anos sem vê-los e aos meus pais a saudade está apertada.
O acontecimento mais importante, no entanto, está na mudança de seminário, digo, juvenato. Foram extintas as séries inferiores do ginásio aqui em Mendes. O clima de despedida reina entre todos nós. O ano de 1962 será vivido em Uberaba-MG lá no triângulo mineiro. Das férias com a família já seguirei para o novo destino.
A despedida tem um gostinho de até breve. Em 1963 estarei de volta para fazer o 3º ano ginasial. Mas de qualquer forma o desconhecido nos dá sentimentos de insegurança pelo desconhecido.
Para a minha ida às férias tive a sorte de pegar uma carona em um Oldsmobile do pai do Halrey, colega e conterrâneo meu. Papai não precisou e acho que nem poderia vir me buscar.
Rever meus parentes foi de uma alegria imensa. Mamãe ganhou sua primeira geladeira, Frigidaire, mostra de que papai financeiramente está melhor. Meus irmãos cresceram demais. Passarei com todos vinte dias muito legais. Inclui-se aí o Natal. Procuro fazer minhas preces matinais, vesperais e noturnas. Tenho um manual de férias a preencher. Não posso esquecer a disciplina religiosa, na medida do possível indo às missas diariamente. Não é difícil. Papai continua fiel aos velhos costumes. Só que da igreja já vai direto aos Correios.
Volto para casa e procuro interagir, não mais como um molecote como dantes. A vizinhança e a farta parentela a me convidar para cafés e almoços. Se dantes de seguir ao seminário já era figurinha rara, imagina-se agora como sou tratado. E por ser referência tenho que fazer comportamentalmente por onde.
Continuo sendo o xodó da vovó Lídia, para ciumeira dos outros setenta netos.
Ganhei dez contos de réis do vovô João e aproveitei para comprar um lindo pintinho de um vendedor lá na estação Central do Brasil. O bichinho amarelinho e frágil me cativou ao primeiro olhar. Custou um conto de réis. Papai colocou um cesto de palha bem grande para acomodar o pobrezinho. Pia o dia todo, apesar do fubá e do milho pilado à sua disposição.
Aconteceu um acidente, a Dinha, prima velha que mora com a mamãe pisou no “Lamparina”, apelido que papai colocou no pintinho. O bichinho quebrou a asa. Papai encanou-a. Tomara que o coitado não sofra muito, embora esteja piando muito mais.
Conforme combinado, mais uma vez o pai do Harley nos conduzirá ao destino: Belo Horizonte. Ficaremos alojados no colégio Marista da capital mineira aguardando os outros juvenistas que, como eu, estão sendo transferidos para Uberaba. Desta vez não vamos de carro, mas de Litorina, trem de um só vagão, rápido e silencioso.
Após as já conhecidas despedidas, chorosas e saudosas por parte principalmente da mamãe, seguimos viagem. Lá pelas tantas, mergulhado nos meus pensamentos, dividido entre querer encarar as novidades da vida mas lamentando a repetida separação dos meus amados familiares, noto que o balançar do trem entre trilhos me alerta par uma lembrança. Não sabia bem qual. Ah! Não poderia ser outra coisa: a similitude dos ruídos das rodas do trem com o piado do “Lamparina” faz-me verter lágrimas de saudades.



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Um comentário:

Ana disse...

Paulo! Há quanto tempo! Muito legal você ter continuado! Esava sentindo falta!
Abraço.