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quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Mudança - por Adir Vieira

Estou de mudança. Enfim compramos o apartamento tão sonhado. Quisemos que fosse localizado numa rua tranqüila e arborizada, bem longe do burburinho do comércio.
Era imprescindível que toda a frente recebesse sol da manhã, para que no verão próximo e em todos os outros que lá passaremos, as tardes se encarregassem de esfriar as paredes, garantindo que o clima, à noite, fosse quase o ideal.
Embora o prédio tenha playground e duas grandes piscinas, o escolhemos, entre outros, porque essas áreas ficam bem destacadas do corpo predial e assim não seremos perturbados.
Como se situa em centro de terreno, todo o seu entorno é repleto de pequenos arbustos e folhagens coloridas e, logo na entrada, uma grande roseira de flores vermelhas que dão ao local uma vista deliciosa.
A portaria, embora luxuosa, possui apenas um grande sofá, propositalmente colocado na frente de uma parede espelhada e não permite, por seu arranjo, que moradores ou visitantes ali permaneçam por muito tempo, o que propicia a ausência total de desordem das crianças mais peraltas.
Quisemos também que fosse no sétimo andar, pois, assim, teríamos uma paisagem mais abrangente e ficaríamos alheios aos possíveis ruídos vindos da rua.
O que mais me fez apaixonada por ele foram os corredores amplos, em mármore branco, longos, para nos dar a impressão de caminharmos em purificação até chegar à entrada.
As duas portas de entrada – sala e área de serviço – em madeira branca com detalhes dourados, deram ao local um ar de suntuosidade aparente, convidando a quem chegasse a observar o bom gosto.
Escolhi para essa entrada os melhores limpa-pés. Nada de pequeninos: altos, sem frisos ou bordas, de cor marrom claro, perfeitos…
Ao abrir-se a porta vê-se um corredor comprido, espelhado, que, por seu tamanho, pode alojar um aparador igualmente branco, onde planejei colocar um vaso de cano alto e a caixa para correspondências trazida de Portugal.
A passadeira também foi comprada com critério. Nada de motivos florais ou linhas sem expressão. De cor caramelo forte forma, no centro, um desenho irregular que a fez diferente de qualquer outra.O corredor dá acesso aos três amplos quartos: o de casal com suíte de rainha, que decoramos de branco, com cortinas em tom pastel, o de hóspedes em tom verde clarinho e o destinado apenas ao repouso, decorado em amarelo suave. Este recebeu três grandes poltronas acolchoadas e de tecido com florzinhas miúdas, do tempo da vovó, uma mesa de centro para livros e revistas e vários almofadões espalhados pelo chão. Coloquei um vaso de plantas com uma grande folhagem junto à janela e não esqueci do carrinho de chá, em palhinha chinesa, presente de uma grande amiga numa viagem ao exterior.
Todos os quartos exibem, com galhardia, as telas pintadas por meu marido, motivo pelo qual esse apartamento tem um espaço somente para o seu trabalho de pintura. Seu novo atelier. Foi difícil arranjar, nos lugares certos, os inúmeros vidros de tinta a óleo, as pranchetas de vários tamanhos, cavaletes e telas virgens. No final tudo ficou lindo. Persianas quase transparentes cobrem o imenso janelão de frente para a rua, cenário perfeito para o trabalho do meu artista.
O corredor também dá acesso à sala de dois pavimentos, divina com seus sofás em tom ferrugem e uma obra de arte, uma figura de mulher, em mármore branco, de tamanho natural, em um dos cantos. Para a sala designei um dos seus quadros mais bonitos, tipo painel com uma moldura em madeira, inigualável. Foi o primeiro dos quadros que pintou e que fez com que eu o incentivasse para compor um grande acervo, hoje, com muitas e muitas obras de fino gosto.
No final do corredor, a cozinha, toda em amarelo claro, me diz onde estarei a maior parte do meu tempo. Adequadíssima e perfeitamente equipada, tem todos os apetrechos à mostra, à mão, já que o espaço assim o permite. Ali será o meu laboratório diário nas iguarias que pretendo preparar, a começar pelo almoço de inauguração do apartamento e mostra à família que hoje, numerosa, pode ser abrigada de uma só vez.
Não esqueci de colocar numa espécie de pedestal meus livros de receita preferidos. A bela fruteira vinda da Áustria será cuidada para que esteja sempre ornada com as frutas de minha preferência.Dois outros banheiros enormes em branco neve, com as louças em preto, darão, sem dúvida, à nossa higiene diária, um prazer e uma calma permanentes. Localizados um tanto distante das áreas comuns, garantem a privacidade necessária aos banhos de sais que, agora, serão costumeiros.
As áreas de serviço ficaram restritas à guarda de objetos e equipamentos sem utilização, tal qual um almoxarifado doméstico.
Enfim, estamos de mudança. Já contratamos duas auxiliares para a manutenção geral da limpeza, a cada semana.
O último caminhão segue agora com os nossos pertences finais.
Viro-me e, vendo meu cantinho totalmente vazio, a futura saudade não me deixa ir em frente.
Em poucos minutos vivo e revivo tudo o que aqui construí nesses quinze anos e, de repente, quase me arrependo de partir.
Enfim, estou de mudança... mas não totalmente feliz.
.

2 comentários:

Anônimo disse...

Comentário por ana — 29 janeiro 2009 @ 19:43

Mudei-me com voces. Vi cada comodo, a decoração, os arranjos, os quadros do Jorge, a insensatez da cozinha com as iguarias que levarão qualquer vigilante do peso a loucura.
Mas vi o amor que quase nao cabe em tanto espaço, em cada quadro, em cada poesia.
Vi a saudade da casa antiga repleta de sonhos e de lembranças.
Vi a alegria dos parentes chegando e saindo, levando consigo abraços e saudades.
Vi o sol mansinho chegando de manhã, tímido, a acordar voces.
E finalmente me vi chegando na porta e sendo rodeada por dois grandes amigos num lar onde tudo cheira a lembranças, coisas boas e muito amor.
Parabéns.Amei.

Anônimo disse...

Comentário por Ana — 4 fevereiro 2009 @ 11:41

Adir:
O seu texto nos faz pensar em como as coisas podem ser tão espantosamente relativas!
Parabéns!
Um beijo!