que me anula como pessoa atual e comum:
é uma lucidez vazia, como explicar?
Assim como um cálculo matemático perfeito
do qual, no entanto, não se precise.
Estou por assim dizer
vendo claramente o vazio.
E nem entendo aquilo que entendo:
pois estou infinitamente maior que eu mesma,
e não me alcanço.
Além do que:
que faço dessa lucidez?
Sei também que esta minha lucidez
pode-se tornar o inferno humano
– já me aconteceu antes.
Pois sei que
– em termos de nossa diária
e permanente acomodação
resignada à irrealidade –
essa clareza de realidade
é um risco.
Apagai, pois, minha flama, Deus,
porque ela não me serve para viver os dias.
Ajudai-me a de novo consistir
dos modos possíveis.
Eu consisto,
eu consisto,
amém.
Nota de Alba Vieira
Destaquei este texto da Clarice como demonstração do quanto ela sempre foi antenada, dizendo coisas que alcançava através de suas vivências e que hoje muitos podem ter acesso através dos textos de metafísica.
Destaquei este texto da Clarice como demonstração do quanto ela sempre foi antenada, dizendo coisas que alcançava através de suas vivências e que hoje muitos podem ter acesso através dos textos de metafísica.
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Um comentário:
Espetacular!
Devo dizer que muitas vezes pensei isto mesmo. Não com estas palavras e forma, obviamente, visto que não sou nem a poeira em que pisaria Clarice, mas pensei. A lucidez, a consciência, a clareza são, muitas vezes, absolutamente perigosas e um fardo. Ainda mais quando se encontram solitárias em meio a um cego senso comum.
Muito bem escolhido o texto, Alba!
Beijo.
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