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quinta-feira, 20 de março de 2014

Post Inesquecível do Duelos - Indicado por Ana

Este é um dos posts de João Luis Amaral aqui no Duelos (infelizmente, ele publicou poucos...). Adorei este texto porque é de um humor fluido, bem desenvolvido, muito interessante. Acho que vale a pena ler de novo, como disse a Lélia. Espero que vocês gostem, como eu gosto.



ZIZI POSSI
(JOÃO LUIS AMARAL)

Zizi Possi já era.

Culpa minha. Dia ruim, cheguei sem avisar e vi o que ninguém aguentaria ver. Ela com outro.
Perdi a cabeça, disse coisas que não devia, chorei até. Ela, frágil, não suportou o destempero.
Acabou por dar cabo à própria vida.

Uma diva, não tenho dúvidas. Uma estrela que brilhou intensamente, iluminou com sua luz a minha vida.
Entre todas com as quais me relacionei - e foram muitas, ouso dizer - Zizi foi como uma brisa leve, pousando delicadamente sobre mim a alegria de viver em seus atos, seus gestos. Enamorado que estava, fazia promessas tolas, achando que teria todo o tempo do mundo para cumpri-las. Só que o tempo... Ah! O tempo não me deu tempo.

Zizi Possi virou história.

Uma relação complicada desde os primeiros momentos. Deliciosamente complicada.
Nossa história começou como um conto de fadas. Eu andava pela rua, sem destino ou futuro certo pela frente, chutando pedras à mercê. Chutava o vazio da minha vida.
Ela, numa loja qualquer, parecia aguardar o inesperado. Nossos olhares cruzaram-se e, apenas num segundo, sentimos a emoção por um amor iminente brotar maroto.

Paixão avassaladora. Daquelas que nos fazem perder o fôlego, a noção de tempo, espaço, que nos leva simplesmente a esquecer nomes, rostos, cheiros. Que nos faz criança.
Os sentidos nos deixaram, tudo o que fazíamos era pelo outro. Éramos cúmplices em sua mais pura tradução - se é que existe pureza em cumplicidade.

Zizi Possi passou dessa para melhor.

Da paixão, rapidamente fomos levados ao amor. O desejo nos tomava inteiros, sem pedir licença. Como numa invasão.
A distância parecia nos asfixiar lenta e perigosamente. Sua presença trazia-me de volta à realidade, era como oxigênio.
Perdíamos longas horas apenas nos olhando. Tímida, não apreciava conversar. Preferia curtir o momento em toda sua intensidade, sua extensão.
E quanto mais durasse, melhor. Foi o grande amor da minha vida. O único amor.

Zizi Possi bateu com as botas.

Ah, Zizi! Que falta você me fará. Não vejo meus dias sem sua doce presença, seu afeto, seu silêncio acalentador.
Não quero mais acordar, porque sei que você não estará mais ao meu lado.
Para quem direi “bom dia” cheio de malícia, de segundas intenções?
Onde errei? Quando te perdi? Por favor, preciso saber.
Não me deixe aqui com essa dúvida. Conte-me ao menos esse segredo.

Zizi Possi está morta.

Agora, de volta ao vazio da minha vida. Tudo o que me resta é voltar àquela loja e comprar um outro peixinho.
Mas, dessa vez, darei o nome de Jane Duboc.
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Deixei a Vida me Levar - por Alba Vieira

Encontro-me sem energia, sem disposição para estudar, não saio do quarto, a não ser que seja obrigado por alguma tarefa a realizar. Sou um adulto jovem, tenho três filhos e estou desempregado. Refleti demoradamente sobre minha situação atual e percebo que ela é decorrente de anos de escolhas inadequadas. Acho que passei a minha vida me enganando. Sim, porque acreditei que as outras pessoas iriam fazer aquilo que eu esperava delas e isto não aconteceu. Agora eu estou certo de que não nasci para ser um provedor, para dedicar a minha vida a viabilizar a vida de outras pessoas, a possibilitar o desenvolvimento dos filhos. Mas, na verdade, as pessoas não me enganaram, eu é que esperei demais delas. E como eu escolhi fazer o que realmente não queria e não tinha a menor vocação, nada deu certo. Eu me sinto um fracassado. E o pior é que depois de tudo que fiz pelos meus filhos, que hoje já são dois adultos e um adolescente, recebo deles a cobrança por ter deixado de suprir suas necessidades por força das circunstâncias. E tento, desesperadamente, conseguir uma boa colocação no mercado para voltar a corresponder às suas expectativas e de minha esposa, estudando (ou melhor, querendo e não conseguindo estudar) para concursos públicos. Só que não nasci para esta vida, não é o tipo de trabalho que quero fazer, meu sonho está em outro lugar. E, como me empenho por algo que não me motiva, não tenho energia para fazê-lo. Estou em depressão, que se arrasta por muitos meses, depois de muitos anos em que me irritei continuamente e vivi em brigas eternas com minha esposa, que pensa de forma bem diferente de mim. O fato é que tenho agido dentro das expectativas dela. E enquanto ela está realizada com a vida que vem levando, diferente da que me fez acreditar que gostaria de viver ao meu lado, eu sou só frustração. Agora entendo que não posso continuar nesse caminho, porque na verdade, já parei. Preciso fazer mudanças em minha vida, profundas transformações. Estou vivendo, há muitos anos, o que escolheram que eu vivesse, não o que eu próprio escolhi. Estou tão perdido ainda...
Acho que acabei de encontrar um caminho. Sei agora um pouco mais sobre mim mesmo. Falta ainda iniciar a jornada com outro rumo.



Visitem Alba Vieira
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René Descartes: Penso, Logo Existo - Citado por Penélope Charmosa

De há muito tinha notado que, pelo que respeita à conduta, é necessário algumas vezes seguir como indubitáveis opiniões que sabemos serem muito incertas (...). Mas, agora que resolvera dedicar-me apenas à descoberta da verdade, pensei que era necessário proceder exatamente ao contrário, e rejeitar, como absolutamente falso, tudo aquilo em que pudesse imaginar a menor dúvida, a fim de ver se, após isso, não ficaria qualquer coisa nas minhas opiniões que fosse inteiramente indubitável.
Assim, porque os nossos sentidos nos enganam algumas vezes, eu quis supor que nada há que seja tal como eles o fazem imaginar. E porque há homens que se enganam ao raciocinar, até nos mais simples temas de geometria, e neles cometem paralogismos, rejeitei como falsas, visto estar sujeito a enganar-me como qualquer outro, todas as razões de que até então me servira nas demonstrações. Finalmente, considerando que os pensamentos que temos quando acordados nos podem ocorrer também quando dormimos, sem que neste caso nenhum seja verdadeiro, resolvi supor que tudo o que até então encontrara acolhimento no meu espírito não era mais verdadeiro que as ilusões dos meus sonhos. Mas, logo em seguida, notei que, enquanto assim queria pensar que tudo era falso, eu, que assim o pensava, necessariamente era alguma coisa. E notando esta verdade: eu penso, logo existo, era tão firme e tão certa que todas as extravagantes suposições dos céticos seriam impotentes para a abalar, julguei que a podia aceitar, sem escrúpulo, para primeiro princípio da filosofia que procurava.



In “Discurso sobre o Método”.
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