.
PASMEM-SE
.
.
O verbo do título não tem a pretensão de um imperativo, antes disso, é um convite a se espantarem juntamente comigo.
Bem cedinho, 06:30 da manhã, sentado à mesa do café matinal, já tendo encontrado a tv da cozinha ligada, não pude deixar de assistir a uma reportagem no primeiro jornal do dia: em um determinado colégio de São Paulo, depois de um mutirão de pintura pelos pais e alunos por ocasião das comemorações de 7 de Setembro, foram surpreendidos dois dias depois com salas e muros internos todos pichados. Até aí, pode o amigo que me lê, perguntar: “Onde o motivo para espanto? Afinal, destas notícias já estamos saturados”. Concordo e peço paciência, chegarei lá. Após a apresentação de alguns testemunhos de pertinentes reações ao mal feito veio a bomba: a professora responsável pelo patrimônio do colégio, descobrindo o malfeitor executor do estrago, fê-lo pegar rolo e tinta e apagar, consertar todo o desacato. Vivas, alvíssaras, parabéns disse eu, ainda com o gosto do último gole de café na boca. Muitos outros também devem ter dito o mesmo à desagravada professora. Só que a estória não ficou por aí porquanto a família do aluno, melindrada pela correção da dita cuja, deu queixa à polícia e o escambau! O filhinho querido fora exacerbadamente corrigido pela professora, disseram. Ela a partir de então foi tratada como uma praticante de verdadeiro estupro moral ao coitadinho do aluno, que declarou estar envergonhado e não querer mais ir ao colégio. Pai, mãe e agregados, tomando as dores do filho, imputaram a culpa à professora.
Logo em seguida a matéria jornalística apresenta a professora pedindo desculpas e se dizendo culpada pelo exagero do gesto.
Aí parei pra pensar, analisar os fatos em si.
O ato da professora foi espetacular. Não creio que pegar este aluno, levá-lo perante um juiz e aguardar uma punição por parte da justiça fosse o caso. Não vem ao caso apelar para nossa “justiça” tão assoberbada em pilhas de processos em um caso mesquinho e paroquial. Uma professora de fim de subúrbio tem capacidade de executar, sim, uma tarefa tomando para si a incumbência de uma punição modelar.
Paizinhos queridos, ofendidos pelo seu filhinho pivete, terem recebido de uma professora o que eles mesmos não conseguiram dar a seus rebentos não justifica a reação adotada.
Estabeleceu-se como ridícula a posição da professora pelo fato de ela vir a público e pedir desculpas pelo seu ato.
A aceitar-se tal posicionamento da mestra por ter praticado tal ato com sentimento de vingança, tudo bem. Não foi isso, porém, o que ficou evidente na matéria.
Considero uma tremenda inversão de valores.
Quanto ao melindroso moleque, é para perguntar-lhe se aqueles que tão amorosamente fizeram consertos e pinturas no colégio como ato cívico em 7 de Setembro também não podem se sentir melindrados pelo seu gesto infame, e qual seria então o direito de resposta de todos estes ofendidos. Pincel nele, professora, sem medos e sem receios.
.